Discurso de Lula da Silva (excerto)

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sábado, 10 de abril de 2010

Shahd Wadi queria poder chamar feministas às palestinianas


  
Shahd Wadi veio para Portugal "por amor" PAulo ricca

Shahd Wadi queria poder chamar feministas às palestinianas

Por Maria João Lopes
Estudou as mulheres palestinianas para se conhecer melhor a si própria e escreveu a primeira tese em Estudos Feministas feita em Portugal. Shahd Wadi anda à procura das suas raízes

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Tinha 15 anos quando pisou o solo da Palestina pela primeira vez. Foi-lhe dada autorização para ir à Cisjordânia com os pais, exilados na Jordânia. Durante a visita, uma amiga apontou para uma montanha e disse-lhe que ali era a vila de onde os seus avós tinham sido obrigados a partir em 1948. Ainda levaram a chave de casa, acreditando que seria temporário. Estava tão próxima e não podia lá ir. Foi assim que Shahd Wadi, hoje com 27 anos e a viver em Portugal, percebeu o que queria dizer "ocupação" e foi "naquele momento" que a Palestina se tornou o seu "projecto de vida".

Feminismos dos corpos ocupados: As mulheres palestinianas entre duas resistências é o título da tese de mestrado que Shahd Wadi defendeu a 25 de Janeiro na Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra. Teve 18 valores. É a primeira tese em Estudos Feministas do país - apesar de existirem áreas semelhantes noutras faculdades, nenhuma adopta a designação "feministas". Mas porquê este tema?

Shahd Wadi vem de uma família que, nas suas palavras, foi "forçada ao exílio duas vezes". "Antes da ocupação a minha família vivia numa vila nos territórios que foram ocupados em 1948, hoje Israel, e foram obrigados ao exílio para a Cisjordânia. O meu pai nasceu lá, numa tenda de refugiados, e, depois, foram obrigados ao exílio, uma vez mais, em 1967, para a Jordânia", conta.

Apesar de ter nascido no Egipto - a mãe é egípcia - e de ter vivido a maior parte do tempo na Jordânia, onde estudou Línguas, Shahd Wadi é também palestiniana. Hoje vive em Portugal, onde está a fazer um estágio no gabinete de tradução e imprensa na Delegação-Geral da Palestina. Veio "por amor", casou-se com um português e mora em Lisboa há quase quatro anos.

Emancipação

Diz que anda à procura das suas raízes. Fá-lo-ia em qualquer ponto do mundo. Ser-se palestiniana é isso, explica: "A Palestina está em todo o lado. Como perdemos a terra, recuperámo-la em qualquer sítio."

Na Cisjordânia esteve apenas duas vezes e por "pequenos períodos". Ao irmão nunca foi dado o bilhete de identidade necessário e o resto da família, apesar de autorizada, não quis voltar lá sem ele.

A certa altura, Shahd Wadi decidiu conhecer aquela terra através das mulheres que a habitam. "Conhecê-las é conhecer-me a mim."

Agnóstica e interessada em estudos feministas, poderia estar mais longe dos estereótipos que diz existirem no Ocidente sobre as mulheres árabes? "Cá poucas pessoas conhecem as políticas, as escritoras, as pintoras...", afirma. Conhecem sobretudo, acrescenta, a refugiada em frente à tenda, a mãe com o vestido tradicional que, às vezes, chora, outras celebra a morte dos filhos, a lutadora com pedras, a bombista suicida, a oprimida, a revolucionária, a pobre, a terrorista. Representações que fazem parte de uma realidade bem mais complexa que é a Palestina e o conflito israelo-palestiniano, continua.

Quem são elas afinal? Esta foi a pergunta de Shahd Wadi, que ouviu muitas "estórias das mulheres palestinianas" contadas pela mãe, Sana"a Moharram, que trabalha na área da cultura da Organização de Libertação da Palestina (OLP). O pai, Farouq Wadi, é escritor.

Na sua tese, Wadi - que teve como orientadora Adriana Bebiano, investigadora do Centro de Estudos Sociais de Coimbra e uma das coordenadoras do mestrado e doutoramento em Estudos Feministas - situa-as no conflito, percebe que efeitos tem na vida delas. A conclusão a que chega é a de que, "apesar de viverem sob ocupação e numa sociedade sexista, há muitos sinais de um certo grau de emancipação política e cultural".

Com a ocupação, "as mulheres emergiram no espaço público". De todas as classes e idades, com ou sem consciência feminista: de políticas que organizaram congressos a camponesas que tiraram o véue dividiram o trabalho com os homens.

Papel político

Muitas mulheres, conta, começaram a "participar activamente", de forma espontânea ou formal, no "movimento da resistência". Há vários testemunhos citados na tese - retirados de jornais, livros, filmes -, como o de uma mulher que "foi aprisionada por ter contrabandeado cartas da OLP para o filho". Quando foi presa, afirmou não pertencer a "nenhum movimento político palestiniano", mas desde que lhe levaram o filho, arranjou o "passatempo" de "trabalhar para a revolução".

Shahd Wadi diz que as casas de muitas mulheres se tornaram "espaços públicos" e conta a história de uma mãe que disse não poder "ficar parada, com as mãos cruzadas, à espera" que o filho lhe desse uma tarefa. Quando o via em casa com colegas "a discutir coisas com a porta fechada" assumia a "função de vigiar". Era ela quem ia ao advogado e ao médico tratar dos assuntos do filho quando ele estava preso. Estivesse ele "fora ou dentro da prisão", ela, mesmo sem ser membro, sentia-se "recrutada" pelo partido "a que ele pertence". "As mães têm um papel político, para além do tradicional", explica.

Há ainda o relato de uma mulher que "enfrentou os soldados", depois de ter escondido o marido na cozinha, dizendo-lhe que "as mulheres aguentam mais do que os homens". Porém, muitas destas mulheres ainda recusam os "feminismos" por os associarem a "valores ocidentais inadequados".

Serão, afinal, "movimentos nacionalistas ou feministas?", pergunta-se Wadi, para quem não há uma luta ou outra, as duas são formas de "libertação" que existem lado a lado. Mas "podemos ter a coragem de lhes chamar movimentos feministas?", pergunta na sua tese. "Não sei se tenho coragem, mas gostaria de dizer: "Acho que sim.""
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COMENTÁRIOS
    Anónimo, Coimbra. 09.04.2010 22:30  
    Responde ao comentário com o título "Ai, jesus"
    (Um bug na site não me está a permitir clicar no link "responder a este comentário.) Acredito que seja tão difícil a quem fez esse comentário saber o que são estudos feministas como perceber a diferença entre fissão e fusão nuclear. Recomendo-lhe a wikipedia. De qualquer modo, posso informar-lhe que usei à poucos meses a uma teoria da economia feminista para ajudar uma cooperativa de agricultores a escolher as culturas que deve apoiar prioritariamente e como. Informar-se antes de enviar postas de pescada faz falta. Abraços
    Anónimo, Lisboa. 09.04.2010 18:03  
    Ah! Feministas...
    Eu também apresentei uma tese em Janeiro. E também tive 18 valores. Onde é que está a minha notícia?
    Sérgio C., Porto. 09.04.2010 16:38  
    Parabéns!
    É de aplaudir a Shahd Wadi e a sua tese. O feminismo, a defesa dos direitos da mulher, de igualdades que não existem, de discriminações tantas vezes desumanas, é necessário e os Estudos Feministas pertinentes. Opiniões como "com o domínio do homem chegámos onde chegámos(...) Com um domínio feminino ainda estaríamos na idade da pedra a comer raízes e a dormir em cavernas." ou por oposto, de que as mulheres "são mais sensatas, mais guardadoras da família e de si, até mais preservadoras da espécie (!), mais perseverantes, etc" são extremistas, sexistas, escusadas.
    Eu, Alugueres na BEira. 09.04.2010 16:19  
    Ai Jasus\
    Estudos feministas é quase tão produtivo, e beneficia tanto a sociedade, como o estudo das lesmas que morrem a tentar passar a segunda circular de monsanto para Benfica...é tipo fazer uma ridicularidade e ganhar fama por isso...é humilhar a mulher ainda mais quando se permitem elaas própria a ser estudadas como especie autonoma que precisa de emancipação....
    Henrique o Navegador, Bélgica. 09.04.2010 08:58  
    A verdade escondida das palestinianas
    Nem de propósito. Ontem, 08/04/2010, num canal de televisão francês, uma reportagem sobre a vida das mulheres na faxa de Gaza mostrava o seguinte: Um jovem de cerca de vinte anos, com a cumplicidade do irmão, mata a irmã. Porquê? Porque esta teve relações com um homem com quem não se casaria. Pelo seu "crime de honra" foi julgado. A pena? Foi multado em 3.000 euros e posto em liberdade. A mãe, desesperada, discutia com o marido pelo facto de ele nada ter feito para impedir o crime, que sabia ia ser cometido. E o que fez o marido? Deitou pela janela do apartamento onde habitavam a própria mulher, matando-a também. Agora, aguarda pelo julgamento, mas acredita-se que terá apenas uma pena simbólica. Esta realidade das mulheres muçulmanas da Palestina é retratada pela Shahd Wadi? É que escrever coisas muito bonitas, receber dezoito valores, ter consideração e prestígio, mesmo alguma fama, tudo isso é compatível com a falta de verdade sobre o que se passa na Palestina?
    Maria da Saudade de Oliveira Simoes, Tramagal. 08.04.2010 22:55   
    Vozes dissonantes
    A universalidade do Homem sempre serviu os interesses dos homens e mesmo com a teoria do Universal neutro o que aconteceu é que desde sempre houve a supremacia do sexo masculino em deterimento das mulheres. Os poderes instituidos sempre usaram essa supermacia para governar o mundo, e vejam onde chegámos. No entanto , desde sempre aconteceu que homens e mulheres foram vozes dissonantes da propaganda dominante. Tu és uma delas, parabéns. E para terminar e citando a Professora Fernanda Henriques, outra voz dissonante, as mulheres tem que ser muito resistentes para terem chegado onde chegaram.
    Conceição Alves, Estremoz. 08.04.2010 15:38  
    Estudos Feministas
    O meu comentário vai para a designação da ÁREA dos Estudos. Temos que concordar que algo de estranho se passa para haver estudos feministas e não serem conhecidos estudos sobre o «masculinismo»?! Ou, na versão portuguesa o «Marialvismo»? Pois se há necessidade de uma certa defesa do feminismo e das mulheres, que em percentagem populacional ultrapassam os homens, isso corresponde ao outro lado de uma moeda - o marialvismo. Como se não bastassem as tradições arreigadas, na pré-crise que há muito estava esboçada, há um país, e toda uma sociedade, que nos últimos 5 anos regrediu, nos direitos que concede às mulheres. Já agora, e ainda numa outra face de uma outra moeda (que também está em circulação...) ao retirar direitos às mulheres que são mais sensatas, mais guardadoras da família e de si, até mais preservadoras da espécie (!), mais perseverantes, etc., etc., etc. é contribuir para a degradação da sociedade, que em teoria se imagina a si, com todos os membros com direitos iguais. É uma traição, ninguém avisou que iria proceder assim, e a sociedade, não avisada, vai decaíndo. Ou, até mesmo caíndo fundo, para o abismo. Não perco nada, mas lamento outros, muito empobrecidos por isso...
    Zé Paulo, Faro. 08.04.2010 13:19  
    As muçulmanas
    Estive na Palestina em 2008. A maioria dos lugares cristãos são habitados por palestinianos. Francamente, a ideia com que fiquei das mulheres palestinianas, não das velhas, mas das novas, foi bastante má: andam de cabeça baixa, mal olham para o lado; fingem que não vêem os turistas, são muito macambúzias. Aliás, noutros países muçulmanos é ainda pior, como na Arábia Saudita e Irão, embora não tenha estado nestes dois países. Parece-me que naquela área, são as muçulmanas do Líbano, pelo menos as de Beirute, que me surpreenderam mais pela positiva, embora as cristãs, também de Beirute se apresentem com um muito maior sentido de liberdade. Penso que a religião islâmica é que é o grande impeditivo da liberdade, especialmente para as mulheres.
    Bruno g. m. Neto, Lisboa. 08.04.2010 12:17  
      Parabéns!!
      Hoje em dia a comunidade palestiniana continua a sofrer do problema gravíssimo de não ter acesso às suas casas, à sua terra, ao seu espaço, mas continuam a ter acesso à memória, à história, às estórias, à paixão e ao sonho de um dia voltar. Ser palestiniano é hoje muito mais do que uma nacionalidade, é um conceito, uma utopia. Parabéns pelo teu trabalho, por continuares a acreditar que um dia poderão regressar, mesmo contra os tanques ou à falta de humanismo básico das pessoas que não o querem deixar. A pequenez humana será superada e nunca desistiremos de lutar!
      Artur, Lisboa. 08.04.2010 11:51  
      "Perdemos a terra"?
      "Perdemos a terra"? Qual? os 90% ocupados pela Jordânia? "Agnóstica"? que bom viveres por aqui, por lá já estavas condenada à morte..
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