por Fatima Oliveira*
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Amo música e gosto de cantar. Não tenho uma voz e tanto, mas sou afinadíssima em meu naipe de contralto. Sou muito musical e do tempo em que canto orfeônico era uma disciplina escolar. Aprendi a solfejar e a ler partitura... Em ''Guarnicê para a música na educação básica'', louvei a obrigatoriedade do ensino da música na educação básica: lei nº 11.769, de 18.8.2008, sob a justificativa de que ''estudos e pesquisas mostram que a aprendizagem musical contribui para o desenvolvimento cognitivo, psicomotor, emocional e afetivo e, principalmente, para a construção de valores pessoais e sociais de crianças, jovens e adultos'' (O TEMPO, 26.8.2008).
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Ser desasnada em música é um privilégio. Participei de corais do primário à universidade. Foi integrando corais que aprendi a ética da convivência grupal, a deferência à disciplina e o adestramento para a fusão de sopranos e contraltos (vozes femininas), e tenores e baixos (vozes masculinas) em doce harmonia que aparentam ser uma única voz. Um coral é um bem cultural incomensurável, fonte donde jorra incessantemente a educação musical e o culto ao belo.
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Voltando às disputas discursivas música caipira & sertaneja, recorro a Elizete Ignácio Garcia, em ''Música Caipira e Música Sertaneja: classificações e discursos sobre autenticidades na perspectiva de críticos e artistas'', que discorre sobre as tentativas de delimitação, definição e diferenciação entre música caipira (autêntica?) e sertaneja (inautêntica?) para ''analisar a relação entre as diversas classificações e reclassificações feitas em torno dos gêneros musicais conhecidos como música caipira e música sertaneja e o debate sobre a ?autenticidade? na e da música''. Seria a música sertaneja um gênero rural urbanizado? Talvez.
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Para alguns autores, conforme Elizete Ignácio Garcia, ''A visão da música sertaneja como produto de consumo para migrantes das áreas rurais ecoa também em segmentos do meio acadêmico, tendo início com os trabalhos de José de Souza Martins (1975) e Waldenyr Caldas (1979). Em ?Música Sertaneja: a dissimulação na linguagem dos humilhados?, Martins tenta demonstrar que música caipira e música sertaneja não são gêneros iguais e que a caipira é indissociável do seu contexto ritual, seja ele religioso ou profano - como os cantos de trabalho e lazer.
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A música caipira é principalmente ?funcional?, na medida em que está inserida no ciclo cotidiano totalizado do caipira. Vista como um meio e não como um fim em si mesma, ela é dotada de valor de uso e não de valor de troca, o que seria a característica principal da música sertaneja - inserida no contexto de indústria cultural, que em tudo se oporia à cultura rústica, matriz da música caipira. Seriam diferentes também os públicos desses gêneros: enquanto os ?consumidores? da música caipira seriam seus próprios ?produtores? - moradores e trabalhadores rurais -, o público da música sertaneja seria formado por aqueles que migraram do campo para os centros urbanos e por seus descendentes''. Enfim, são complexos e inconclusivos os debates eruditos sobre o tema.
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*Fatima Oliveira, Médica e escritora. É do Conselho Diretor da Comissão de Cidadania e Reprodução e do Conselho da Rede de Saúde das Mulheres Latino-americanas e do Caribe. Indicada ao Prêmio Nobel da paz 2005
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in Vermelho - 27 DE MAIO DE 2009 - 00h15
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