Discurso de Lula da Silva (excerto)

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domingo, 2 de maio de 2010

Significado e dimensão históricos do 1.º de Maio e a luta dos trabalhadores na actualidade

Intervenção de José Ernesto Cartaxo, Casa do Alentejo, Lisboa, 

120 anos do 1º de Maio

Significado e dimensão históricos do 1.º de Maio e a luta dos trabalhadores na actualidade

 A história do movimento operário internacional está recheada de acontecimentos e datas extremamente importantes. O 1º de Maio assume, indiscutivelmente, particular relevo e o mais profundo significado histórico.

A este dia estão intimamente ligadas muitas das maiores e mais exaltantes jornadas e movimentações de luta da classe operária, que, com sofrimento, coragem e determinação, demonstrou claramente o quanto é capaz a vontade colectiva dos trabalhadores para melhorar as suas condições de vida e de trabalho, vencer injustiças e desigualdades sociais, mudar mentalidades, transformar as sociedades e pôr fim à exploração do homem pelo homem.
   
- AS ORIGENS DO 1º DE MAIO

   
   Pesem embora algumas deturpações e desvirtuamentos produzidos pelo arsenal ideológico do capital, é generalizadamente reconhecido que as origens do 1.º de Maio estão associadas aos trágicos acontecimentos que ocorreram em 1 de Maio de 1886, na cidade norte-americana de Chicago.
  
    Todavia, para se ter uma visão dialéctica do seu significado histórico, importa assinalar que, na sequência da Revolução Industrial, verificada nos finais do século XVIII, o operariado era objecto de uma intensíssima e desumana exploração, que se traduzia em imensas privações e brutalidades, sendo forçado a trabalhar 12, 14, 16 e mais horas por dia, na indústria e no comércio e, de sol a sol, na agricultura. 
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A exploração desmedida, sem qualquer tipo de escrúpulos, do trabalho infantil e do trabalho feminino era uma fonte suplementar de lucro para o empresário capitalista.
  
     Passada a revolta inicial contra as máquinas, por considerarem serem elas as causadoras dos seus sofrimentos, a classe operária, nascente, e os trabalhadores, em geral, encontram nas ideias contidas no Manifesto Comunista de Marx e Engels, publicado em 1848, as respostas sobre as verdadeiras causas que estão na origem de tão desumana e feroz exploração e sobre os caminhos a trilhar.
    As causas estavam no sistema capitalista, cujo modo de produção se baseia na apropriação privada dos meios de produção e na exploração desenfreada de quem neles trabalha, para a obtenção do máximo lucro, e o caminho apontado era a unidade, a organização e a luta. A palavra de ordem era: PROLETÁRIOS DE TODO O MUNDO, UNI-VOS!

Animado e estimulado por estas ideias, o operariado empreende lutas constantes centradas na redução da jornada de trabalho, por melhores salários e contra a exploração, procurando pôr termo a esta desumana e intolerável situação.
 
    É assim que, em 1866, o Congresso de Genebra da 1ª Internacional estabelece como objectivo a limitação da jornada de trabalho em 8 horas como “condição indispensável ao êxito de qualquer outro esforço emancipador” e adopta, como divisão racional do tempo diário de trabalho, 8 horas de trabalho, 8 horas de descanso e 8 horas para a cultura e a educação, que se converte em exigência iniludível para a protecção do trabalhador como ser humano. 
  
    É neste contexto que a Federação dos Trabalhadores dos Estados Unidos e do Canadá, numa conferência anual, que teve lugar em Dezembro de 1885, convoca uma greve geral para o dia 1 de Maio de 1886, pelas 8 horas. 

       No âmbito desta greve, a que aderiram muitos milhares de trabalhadores, realizaram-se diversas e grandiosas manifestações.
 
   Foi num comício de massas, realizado no dia 4 de Maio, na Praça Haymarket (Mercado do Feno), em Chicago, que foi montada uma manobra provocatória, que constou do rebentamento de uma bomba, colocada de propósito para justificar uma feroz e sangrenta repressão que se abateu sobre os manifestantes, que provocou várias mortes e centenas de feridos e levou à prisão de centenas de militantes sindicais, sendo de distinguir a de oito destacados dirigentes, mais tarde conhecidos como os “oito mártires de Chicago”, sete dos quais condenados à pena de morte e o outro a 15 anos de prisão. 
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    Mas esta heróica luta não foi em vão, porque 50.000 dos operários em greve conquistaram imediatamente o dia de 8 horas de trabalho, enquanto outros 200.000 conseguiram uma certa redução do horário de trabalho.
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        Os trágicos acontecimentos de Chicago tiveram um grande significado, não só para os operários norte-americanos, mas também para todo o proletariado mundial, tendo merecido da parte deste a mais viva solidariedade e enérgica condenação. 
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De tal modo que, em 1889, os representantes dos movimentos socialistas de diversos países se reúnem em Paris e resolvem internacionalizar o 1.º de Maio, declarando-o dia de luta do proletariado, pela jornada de oito horas, e marcando para o 1.º de Maio seguinte, 1890, manifestações simultâneas em todos os países.
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  Nascia, assim, há 120 anos, o Dia Internacional do Trabalhador e estava dado um novo e importante passo na luta do Trabalho contra o Capital. 
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- O 1.º DE MAIO EM PORTUGAL
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 Desde o primeiro ano das comemorações do 1.º de Maio, em 1890, até aos dias de hoje, passando pela monarquia, pela 1.ª República e durante a ditadura fascista, o operariado português sempre comemorou activamente o Dia Internacional do Trabalhador, em unidade e luta e com solidariedade internacionalista, reclamando junto do patronato e das autoridades portuguesas o estabelecimento das 8 horas de trabalho diário e a melhoria das suas condições de vida e de trabalho.
      
         Neste percurso histórico, os ecos da Revolução de Outubro de 1917, na Rússia, chegam a Portugal e suscitam um grande entusiasmo nos trabalhadores portugueses.
  
  Em 1919, após um 1.º de Maio grandioso, é conquistada e consagrada, em Lei, a jornada das 8 horas diárias e 6 dias de trabalho por semana, ainda que só para os trabalhadores da indústria e do comércio.
        
   A 6 de Março de 1921, forma-se o Partido Comunista Português e a classe operária inicia a construção da sua vanguarda revolucionária.
         
    Na ditadura fascista - que suprimiu as liberdades fundamentais, fascizou os sindicatos e oprimiu o nosso povo durante 48 anos – o regime, desde cedo, procurou impedir as comemorações do 1.º de Maio. Em vão, porque, de acordo com a situação concreta em cada momento, o proletariado português, sob a orientação do PCP, soube sempre encontrar as formas mais apropriadas à sua comemoração, não obstante a repressão de que era alvo.
        
        As lutas do 1.º de Maio de 1962, nas quais se empenham mais de 150 mil trabalhadores agrícolas do Sul, do Ribatejo e do Alentejo, acabam por impor o reconhecimento das 8 horas de trabalho diário, pondo termo ao feudal sol a sol.

           Assinalam-se, ainda, importantes manifestações nos 1.º de Maio que se seguiram até 1973 e que, em articulação com as inúmeras lutas que se travavam ao nível das empresas e dos locais de trabalho e na frente sindical, forjaram as condições que viriam a tornar possível a vitoriosa madrugada libertadora do 25 de Abril, desencadeada pelo glorioso Movimento das Forças Armadas.
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Apenas 6 dias após a manhã da liberdade, o povo português comemorou o mais espantoso 1.ºde Maio, organizado pela Intersindical, criada em 1970. Era a alegria incontida de um povo que enterrava 48 anos de terror, de miséria, de obscurantismo. Era a consagração popular do 25 de Abril.
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         Pela primeira vez, dando satisfação a uma reivindicação da Intersindical, o 1.º de Maio era consagrado feriado nacional.
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          A arrancada do 1.º de Maio de 1974 vai dar início a uma série de conquistas que correspondem a prementes reivindicações e anseios das classes trabalhadoras e das massas populares. A determinação e a energia criadora das massas populares em movimento impulsionam a evolução do processo de democratização da vida e da sociedade portuguesa. Conseguem-se profundas transformações económicas e sociais com as nacionalizações, a reforma agrária e o controlo operário. Conquistam-se liberdades e direitos fundamentais.
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         É em 1996, na sequência da luta travada e de várias iniciativas parlamentares do PCP, nomeadamente a apresentação de um projecto de Lei, em 17 de Janeiro deste ano, que o governo de Guterres é forçado a consagrar, na lei, as 40 horas semanais com dois dias de descanso semanal.
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- A IMPORTÂNCIA E ACTUALIDADE  DA LUTA 
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 Como se comprova, ainda que de forma muito sintética, o movimento operário e sindical, através da luta, dura, difícil e perseverante que desenvolveu, escreveu algumas das páginas mais exaltantes da sua história contra a exploração capitalista, o que permitiu alcançar conquistas e avanços civilizacionais que em muito contribuíram para a melhoria das condições de vida e de trabalho dos trabalhadores e das suas famílias. 
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  Contudo, o capital não dorme nem desarma. A partir de 1976, com as políticas de direita seguidas pelos sucessivos governos, a contra-revolução desencadeia-se e de novo se abate sobre os trabalhadores a exploração, a repressão e a tentativa de destruição das conquistas alcançadas.
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A prová-lo está a ofensiva neoliberal em curso de que é exemplo a postura do governo PS/Sócrates, que, ao rever para pior o já negativo Código do Trabalho do PSD/CDS, deu alento à ofensiva patronal, no sentido de o desregular e de impor como jornada de trabalho “normal” as 10, 12 ou mesmo 14 horas por dia, sem o pagamento de qualquer compensação pelo trabalho extraordinário, o que constitui um regresso ao século XIX e às condições de trabalho que estiveram na origem do 1.º de Maio e da sua internacionalização. 
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É em honra da memória dos “mártires de Chicago”e da luta de gerações e gerações de revolucionários, muitos deles com o sacrifício da própria vida, e contra a exploração capitalista que temos o dever e a obrigação de tudo fazer para que se desenvolva e intensifique a luta de massas por uma ruptura com as políticas de direita e para que as comemorações do 1.º de Maio, constituam uma imponente jornada internacionalista de unidade e luta por uma sociedade mais justa, fraterna e solidária, sem exploradores nem explorados.
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