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sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

Mary MacKillop: Uma freira insubmissa chega aos altares




Austrália

Mary MacKillop: Uma freira insubmissa chega aos altares

Público - 26.02.2010 - 00:13 Por João Manuel Rocha
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Será uma santa com um percurso pouco convencional, que inclui uma excomunhão. Mary MacKillop, uma freira australiana que o Vaticano vai canonizar no próximo Outono, chega aos altares depois de uma vida de rebeldia, pelo menos aos olhos de católicos mais ortodoxos. "Mary é uma das nossas. Era uma pessoa extraordinária, que teve uma vida santa", declarou o actual arcebispo de Adelaide, Philip Wilson, presidente da Conferência Episcopal Australiana. Opinião bem diferente chegou a ser a da hierarquia católica local, nos finais do século XIX, com a qual se confrontou.
Mary MacKillop, numa fitigrafia captada nos anos 1880  
Mary MacKillop, numa fotigrafia captada nos anos 1880 ()
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Aquela que será a primeira santa australiana, conhecida pelos contemporâneos como Madre Maria da Cruz, deixou obra no campo da educação e trabalho com os mais pobres e já era, para os crentes do seu país, e de outros lugares para onde o seu exemplo se expandiu, uma "santa do povo". Quando morreu, em 1909, aos 67 anos, os choques com a hierarquia eram passado e o então arcebispo de Sydney, cardeal Patrick Moran, saudou-a como santa. Na semana passada, depois de ter dado como provados os necessários milagres para a canonização, Roma, pela voz do Papa Bento XVI, concordou.
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Filha de emigrantes escoceses, mais velha de oito irmãos, Mary Helen nasceu nos subúrbios de Melbourne em 1842. Aprendeu em escolas privadas, mas também com o pai, que tinha estudado para padre. Aos 16 anos, para ajudar a família, que inicialmente prosperou na Austrália, mas a quem a vida se tinha tornado difícil, começou a trabalhar como explicadora e a ensinar numa escola católica para raparigas.
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Em 1866, ano em que completou 24 anos e se tornou freira, abriu a primeira escola num bairro pobre de Penola, incentivada pelo padre e cientista Julian Tenisson Woods, que precisava de ajuda para a educação religiosa das crianças da sua vasta paróquia. A afluência de jovens raparigas levou a que ambos fundassem a Congregação das Irmãs de São José do Sagrado Coração. Em quatro anos, as "josefinas" abririam 34 escolas, mas também centros de acolhimento e orfanatos no Sul da Austrália.
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Insubordinação
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Desentendimentos sobre matérias educativas, vistos como desobediência pelo bispo de Adelaide, Laurence Sheil, que apadrinhara a criação da congregação, levaram-no a excomungar Mary MacKillop, por insubordinação, em Setembro de 1871. Foram momentos complicados: a maior parte das escolas fechou, as Irmãs de São José quase se dissolveram.
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Mas meses depois, em Fevereiro do ano seguinte, a poucos dias de morrer, Sheil revogou a pena. E no ano seguinte, Mary obteve aprovação do Papa Pio IX para a existência da congregação. Só que os conflitos com a hierarquia da Igreja australiana não tinham ainda terminado: ficou também conhecida, nos anos 1880, uma desavença com o então bispo Christopher Reynolds, que lhe ordenou que deixasse a diocese de Adelaide devido a desentendimentos sobre a tutela de escolas e instituições de caridade. Seria de novo um Papa, Leão XIII, a tomar o partido de uma mulher descrita como carinhosa mas determinada, com um enorme amor pelo próximo e grandes olhos azuis como traço físico mais marcante.
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"Ao longo da sua vida, Mary enfrentou a oposição de pessoas no exterior da Igreja e também de algumas no seu interior. Nos tempos mais difíceis recusou terminantemente atacar os que erradamente a acusavam e boicotavam o seu trabalho, mas continuou no caminho que acreditava que Deus lhe indicava e estava sempre pronta a perdoar os que a prejudicaram", refere a biografia existente no site da sua congregação.
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Em 1901, a fundadora das "josefinas" sofreu um acidente vascular que a deixou presa a uma cadeira de rodas,apesar de ter conservado as faculdades mentais. Quando morreu, em Agosto de 1909, a congregação contava com 750 religiosas e tinha 117 escolas e centros de acolhimento para pobres. A sua acção contribuiu para a difusão do catolicismo na Austrália e Nova Zelândia. As Irmãs de São José do Sagrado Coração, respeitadas pelo seu trabalho com crianças necessitadas, ex-reclusas, idosos, sem-abrigo, aborígenes, novos imigrantes ou prostitutas, estão hoje também no Uganda, Peru, Brasil e Tailândia.
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O actual arcebispo de Melbourne, Denis Hart, descreveu Mary como uma mulher de fé, grande educadora, defensora dos pobres e visionária do cristianismo. A canonização "será um grande encorajamento", disse ao jornal australiano The Age. "São amadas pelas pessoas porque partilham as suas lutas e a sua pobreza. Ela e as suas irmãs estiveram sempre muito próximas das pessoas."
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"Nunca fez por isso"
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À filha de emigrantes escoceses nunca terá passado pela cabeça tamanha distinção como a que lhe vai ser conferida a 17 de Outubro, quando for canonizada, juntamente com o Irmão André, conhecido pelos seus dons de cura e primeiro canadiano do Quebeque a ser tornado santo; a religiosa espanhola Cândida Cipitria, fundadora da Congregação Filhas de Jesus; o padre polaco Stanislas Soltys; e as religiosas italianas Giulia Salzano, fundadora do Sagrado Coração de Jesus, e a franciscana Camilla Battista Varanno.
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O que diria se lhe tivessem perguntado que viria a ser considerada santa? "Diria que se isso ajudar as pessoas e se é a vontade de Deus, que se fosse para a frente com isso. Ela nunca fez por isso, mas era muito, muito, determinada em fazer o que pensava que Deus queria que ela fizesse", disse ao jornal Daily Telegraph a australiana Maria Casey, a freira que liderou a campanha para a canonização.
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Os primeiros passos para este desfecho foram dados em 1926, 17 anos após a morte, mas a primeira candidatura oficial à beatificação, passo intermédio para a canonização, data de 1961. Nesse ano foi-lhe atribuída a cura de uma mulher com leucemia em estado terminal, o que conduziu à beatificação em 1995, por João Paulo II. Em Dezembro passado, o Vaticano reconheceu que foi por sua intercessão que uma mulher recuperou de um cancro inoperável no pulmão e de outro no cérebro, em 1993. Estava aberto o caminho para a subida aos altares de uma insubmissa que passará a ser conhecida como Santa Maria da Cruz.
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