Espaço de homenagem a João Nogueira Garcia, um dos fundadores da povoação do Quitexe. Onde se falará da sua grandeza de alma, dos seus poemas, da sua literatura e pintura.
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É a resposta brutal
A todas as injustiças
A todo o mal social
Terrorista Guerrilheiro
Condenado, perseguido
É um homem destemido
Que não luta por dinheiro
Em vida dá o que tem
Dá o bem e faz o mal
Quando procura afinal
Que esse mal seja um bem
Na hora da Libertação
Já não é mais terrorista
É o herói da Nação
O seu maior Estadista
E é nesta contradição
Que não é racional
Que se procura a razão
que há entre o bem e o mal
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Velho, velho, Maculundo
De tão alva carapinha
Tens a verdade do Mundo
Que ninguém mais adivinha
E quando um dia
Descer à cova
Este velho que foi justo
Que na vida até foi Soba
A mando do Muniputo
Ficará dele uma história
Por sinal bem aflita
Levou com a palmatória
Do cipaio e do capita
Humilhado e surrado
Este homem resoluto
Em vida tão mal tratado
A mando do Muniputo
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Acordei já não dormi
Pus-me então a recordar
O que a saudade faz lembrar
Do tempo que já vivi
Neste mundo que rebola
Que gira sempre, sem findar
Recordei terras de Angola
Onde um dia fui parar
Nada aqui é igual
Do que é em Portugal
Tudo é diferente
Os costumes e a gente
E no jeito de vestir
Na maneira de tratar
E na forma de falar
Quando aqui desembarquei
Tinha um desejo muito meu
Ser patrão sempre sonhei!
Vejam só, o que então aconteceu:
Como numa sentença lida,
Eu fui logo promovido
Na hierarquia da vida.
Não me senti ofendido
Mas fiquei muito surpreso,
Com tamanha distinção,
Eu que sempre fui um teso
A ser chamado de patrão
Mas é já uma tradição
É o trato desta gente
Aqui todo o branco é patrão
Mesmo que seja servente
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João Nogueira Garcia foi, sem dúvida, um grande varzeense, com um carinho muito especial pela terra adoptiva, o Quitexe. Sempre viveu intensamente tudo o que dizia respeito a estas duas localidades. Tudo o empolgava, como se de um legado pessoal se tratasse. Porque a Várzea (Vila Nova do Ceira) era a sua terra. Aí nasceu,em 1926, estudou e cresceu até que, aos treze anos, ainda menino da sua mãe, foi para Lisboa aprender o ofício de caixeiro. O miúdo, franzino, viu-se, de repente, feito homem na grande urbe, longe dos carinhos maternos. Subiu todos os degraus da profissão e em 1947, com 21 anos, rumou a Angola, no porão de um navio, em busca da terra prometida. Rapidamente a sua experiência no comércio lhe permitiu construir a sua própria casa comercial no posto administrativo do Quitexe, a terceira a ser edificada no local.
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Casou em 1951 com Maria Aline que o acompanhou nas aventuras angolanas e ao longo da vida. O bom relacionamento e o respeito que nutria pelos povos desta região angolana foram fundamentais na expansão das suas actividades. Já em colaboração com o seu irmão Alfredo foi também agricultor de café e industrial. No Quitexe, que rapidamente cresceu e se tornou vila, nasceram os seus filhos. Envolvido na barbárie que toldou os espíritos de portugueses e angolanos em Março de 61, soube afirmar o seu carácter no respeito pela dignidade humana, contra a violência, a vingança e o terror. Deixou-nos o relato desses dias negros no repositório de memórias que é o livro “Quitexe 61 – Uma Tragédia Anunciada”.
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De regresso à sua terra, é aqui que vai refazer a sua vida e empenhar a sua capacidade empreendedora.
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Foi com enorme prazer que o acompanhei, desde miúdo, nesses seus múltiplos empenhos., Em 1964 fundou a Empresa Cerâmica da Várzea, fomentando a criação de emprego e a dinamização do comércio e indústria na sua terra.
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Dedicado Varzeense foi um abnegado impulsionador, fundador e dirigente da Cooperativa Silvo-Agro-Pecuária de Vila Nova do Ceira e esteve na vanguarda do ressurgimento da Filarmónica Varzeense.
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Lutador pela liberdade, contra a ditadura salazarista, participou activamente na oposição democrática, nomeadamente nas campanhas eleitorais de Humberto Delgado, em Angola, e da CDE em 69.
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Não esqueço, como nas eleições de 69, aos 12 anos, ajudei a colar selos nos envelopes que levavam aos eleitores os boletins de voto da Oposição Democrática. Naquele tempo os eleitores tinham que ser portadores do boletim de voto! Eram tempos negros em que a opressão era a lei.
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Foi de uma geração em que, para se ser político interveniente, fora da corte salazarista da União Nacional, era necessário muita coragem, determinação e, acima de tudo, amor à causa da liberdade e desprendimento de valores materiais. Talvez por isso, foi crescendo a sua desilusão com esta sociedade em que o dinheiro é cada vez mais rei e os princípios, as amizades e os compromissos são espezinhados na voragem da ascensão rápida a cargos e honrarias.
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De facto, a sua intervenção não era marcada apenas pelo obreirismo, esgotando aí a sua realização pessoal. Pelo contrário, visava objectivos políticos bem determinados e balizados. E um deles era a esperança que depositava no cooperativismo, como expressão da solidariedade social, sem fins lucrativos, e a negação da exploração humana. Era nestes ideais que acreditava e, por isso, era determinado na sua defesa o que lhe acarretou incompreensões, desapontamentos e até ingratidão.
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Diria, em síntese, que foi um Homem que não se limitou a plantar uma árvore, mas uma floresta inteira;
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Não se limitou a escrever um livro, escreveu muito mais do que apenas as palavras: redigiu um testemunho vivo de que os valores da dignidade, da exaltação da vida, da amizade e da solidariedade são universais, eternos e compensadores;
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Não se limitou a ter filhos, antes cultivou o sentido da família como ponto central de afectos, união, amizades e cumplicidades.
Ao meu Pai, o meu obrigado!
[João Luís Garcia)
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