A BOM ENTENDEDOR, MEIA PALAVRA BASTA
Frase proverbial, este dito recomenda a concisão no falar, nem sempre aceita pelos latinos, cuja exuberância vai além da fala, estendendo-se também aos gestos. Entretanto, seus dois registros mais famosos foram feitos por dois autores espanhóis: Fernando Rojas (1465-1541), na célebre comédia A celestina, Miguel de Cervantes (1547-1616), em Dom Quixote, mas com a variante "A buen entendedor, breve hablador". Os franceses também excluíram o verbo do ditado, sendo corrente entre eles a expressão "À bom entendeur, demi mot". Exemplos de que não parecemos bons entendedores são nossas leis, inclusive nossa constituição. No Brasil há leis definindo, para efeitos de comercialização, o que é ovo e que tipo de multa deve levar um carroceiro na cidade de São Paulo!
A BONDADE DAS MULHERES É MAIS PASSAGEIRA QUE SUA BELEZA
sta frase é de autoria do escritor espanhol Ramón María del Valleinclán (1839-1936), autor do clássico Tirano Bandeiras, que serviu de inspiração aos escritores latino-americanos cujos romances estruturaram suas narrativas ao redor da figura do déspota, quase sempre caracterizado como grosseiro, ignorante, cruel. Outros livros seus apresentam personagens atormentados por estigmas físicos e morais. O autor, que vestia sempre uma capa negra, teve várias infelicidades amorosas e uma delas teria sido o motivo do duelo que o fez perder um braço. Por isso, o rigor do juízo exagerado sobre a condição feminina pode ter seus fumos autobiográficos.
A CASCAIS, UMA VEZ E NUNCA MAIS
A história desta frase, provérbio consagrado que os portugueses trouxeram para o Brasil, remonta uma praia de Portugal chamada Cascais, muito freqüentada pela família real nos tempos monárquicos, que lá duraram mais do que aqui, dado que a república foi proclamada 21 anos depois da nossa. Tornou-se praia muito cara e apenas os ricos podiam suportar as exageradas despesas. O escritor Português José Valentim Fialho de Almeida (1857-1911) fez o registro da frase famosa no livro Os gatos, em que critica os rega-bofes havidos no balneário, que "o descaramento e o dinheiro só folgadamente permitem a dúzia e meia".
A DAR COM UM PAU
Esta frase, indicando abundância, nasceu no nordeste. Vindas da África, milhares de aves de arribação, extenuadas pela travessia do atlântico, pousam na lavouras em busca de alimentos. Chegam cansadas e famintas, quase desabando sobre o solo. Os sertanejos, porém, não tem nada com isso e aqueles bandos apresentam séria ameaça às plantações. Ou eles matam as aves ou depois não terão o que comer. Desaparelhados para o combate, antigamente os agricultores matavam os pobres pássaros a pau, e não aparecia nenhum ecologista para defendê-los. O escritor Joaquim José da França Júnior (1838-1890), patrono da cadeira 12 da academia Brasileira de Letras, registrou a frase famosa na comédia Direito por linhas tortas: "A mulher tomou sulfatos a dar com um pau".
A DEMOCRACIA É UMA SUPERSTIÇÃO ESTATÍSTICA
Frase atribuída ao escritor argentino Jorge Luís Borges (1899-1986), poeta, prosador e ensaísta que jamais escreveu um romance, limitando-se às narrativas curtas, gêneros em que se mostrou insuperável, revelando grande inventividade e extraordinária visão filosófica. Tinha obsessão por certos temas, como os espelhos e os tigres, e foi autor de frases memoráveis, sempre desconcertantes. Soube manter o encanto também como ensaísta, diluindo as fronteiras dos dois gêneros. Como ficcionista, aludia a autores e livros que jamais existiram, levando o leitor a não ter certeza de que eram realmente inventados, uma vez que Borges era um leitor contumaz, apesar de ter ficado cego muito cedo.
A EMENDA SAIU PIOR DO QUE O SONETO
Querendo uma avaliação, certo candidato a escritor apresentou soneto de sua lavra ao poeta português Manuel Maria Barbosa du Bocage (1765-1805) pedindo-lhe que marcasse com cruzes os erros encontrados. O escritor leu tudo, mas não marcou cruz nenhuma, alegando que elas seriam tantas que a emenda ficaria ainda pior do que o soneto. A autoridade do mestre era incontestável. Bocage levou essa forma poética a tal perfeição que fazia o que bem queria com um soneto, tornando-se muito popular, principalmente em improvisos satíricos e espirituosos, pelos quais é conhecido.
A MAIORIA DOS HOMENS SE APAIXONA POR GILDA, MAS ACORDA COMIGO
Esta frase, dita pela primeira vez pela atriz americana Rita Hayworth (1917-1987), virou metáfora de relações amorosas baseadas na fantasia e que depois caem na real. Rita construiu uma imagem voluptuosa em seus filmes, sobretudo naqueles rodados na segunda guerra mundial, que serviam de entretenimento aos soldados aliados. Deusa do amor nos anos 40, era suave, sensual e charmosa. Ótima dançarina e intérprete, a atriz encontrou boas razões para proferir a frase famosa. Seus casamentos não davam muito certo, mas ela ia persistindo. Teve cinco maridos, entre eles o cineasta americano Orson Welles (1915-1985).
AMIGOS, PERDI O DIA
O imperador romano Tito Flávio Vespasiano (39-81), tido por seus contemporâneos como "a delícia do gênero humano" por reiterar que todos os dias deveria praticar-se uma boa ação, numa espécie de escoteiro avant la lettre, é autor desta frase, exclamada ao final de cada dia em que não pudera cumprir seu propósito. Mas Tito foi também o responsável pela guerra travada pelos romanos contra os judeus, uma das mais sangrentas de toda a história, que resultou na destruição do templo de Jerusalém, do qual só restou o pedaço de uma parede, hoje conhecido com o nome de Muro das Lamentações, onde os judeus costuma orar.
AO DEUS DARÁ
Esta famosa frase serviu originalmente de resposta de quem não queria dar esmolas. Homens duros de coração respondiam aos mendigos que lhe estendiam a mão: Deus dará. Eles não. Quem dependia da caridade pública ficava em má situação, ao Deus dará. A expressão cristalizou-se de tal forma que, no século XVII, um negociante português que vivia no Recife, de tanto proferir a frase, passou a tê-la acrescentada ao próprio nome. Ficou conhecido como Manuel Álvares Deus Dará. Seu filho, Simão Álvares Deus Dará, foi provedor-mor da fazenda do Brasil.
AS PERNAS NÃO SÃO TÃO BONITAS. APENAS SEI O QUE FAZER COM ELAS
Frase pronunciada pela famosa atriz alemã Marlene Dietrich (1901-1992), celebérrima por suas lindas pernas, mostradas por exemplo em O anjo azul, primeiro filme alemã falado, que a consagrou internacionalmente em 1931. Fez também A Vênus loira, A marca da maldade e Marlene, este um documentário de 1984. Nascida em Berlim, naturalizou-se americana em 1939, recusando-se a voltar para à Alemanha por causa do nazismo. Além de bela, muito chique e cheia de mistérios, Marlene fez uma carreira de sucesso como cantora. Morreu às vésperas de ser homenageada pelo festival de cinema de Cannes, na França.
A SELEÇÃO É A PÁTRIA DE CALÇÕES E CHUTEIRAS
Definição tão nacionalista, sumária, apaixonada e inapelável só poderia mesmo ter vindo do arsenal de frases memoráveis do célebre dramaturgo e cronista Nelson Falcão Rodrigues (1912-1980). Senhor de um estilo inconfundível não apenas no teatro, mas também nas crônicas, teve sempre com o futebol uma relação apaixonada. Seus comentários esportivos cultivavam, por vezes, o paradoxo. Vituperando jornalistas que faziam análises lógicas, racionais, ele os chamava de idiota da objetividade. Em 1970, quando a seleção deixou o Brasil sob vaias para ir buscar o tricampeonato no México, Nelson, um dos poucos a acreditar naquele time glorioso, sentenciou: " A seleção deixou o exílio".
A TERRA LHE SEJA LEVE
Esta frase é tradução perfeita da sentença latina "Sit tibi terra levis", que os romanos inscreviam nos túmulos, às vezes apenas com as iniciais S.T.T.L., por considerarem que aos mortos tudo se deveria perdoar. Machado de Assis (1839-1908) faz pequena variação desta frase no romance Dom Casmurro, levando Bentinho, o marido de Capitu, a perdoar a mulher e o amigo Escobar, que conjuntamente o traíram. Apenas de todas as evidências, vários críticos insistem em ignorar um dos adultérios mais comprovados do mundo, o que fez o escritor Otto Lara Rezende (1922-1992), entre outros, publicar famosos artigos sobre o tema, vituperando a obtusidade. Que a terra seja leve também para os que interpretam textos de forma equivocada, às vezes até em livros ditos didáticos.
BATEU AS BOTAS
Esta frase, indicando que o sujeito morreu, é uma variante das tradicionais "Esticou as canelas", "Abotoou o paletó", "Partiu desta para melhor". O curioso, porém, é que se aplica apenas ao morto adulto, do sexo masculino, que tenha o costume de andar de botas ou ao menos calçado. O sapato tem sido símbolo de qualificação social ao longo de nossa história, tendo partilhado seu prestígio com certa marcas de tênis, em busca dos quais adolescentes delinqüentes chegam a matar. Provavelmente bate as botas ao morrer alguém de certas posses, ao menos remediado. Outros morto apenas esticam as canelas ou parte desta para melhor. No segundo caso, partem com estilo, fazendo dupla elipse, já que está subentendido que partiram desta para outra vida, que os comentadores antevêem mais favorável a quem partiu. Dependendo da herança, sua partida é mais favorável para quem ficou. As origens da frase residem no bom trato despedindo aos mortos, posto arrumadinhos nos caixões, com o paletó abotoado. Como, porém, as mulheres passaram a usar roupas semelhantes às dos homens, também elas podem abotoar o paletó à triste hora da partida. A pergunta, entretanto, permanece: triste para quem? Sábios, os latinos cunharam outra frase: "Requiescat in pacem" (descanse em paz). E há um emblema para as cerimônias da morte, o Requiem (Descanso). Um dos mais célebres é o de Mozart.
CAIR NA GANDAIA
Cair na gandaia é variação de andar à e na gandaia e se aplica a quem leva vida de vadiagem, sem responsabilidade, viajando para muito longe, por muito tempo, sem dar explicações a ninguém. Pode ter havido influência da grafia equivoca de Catai, na Cochinchina, esta última com o significado de lugar muito distante. Catai passou a Gadai e daí a Gandaia. Viver na gandaia equivale a não trabalhar, entregar-se ao ócio. Gandaiar é também o ofício do trapeiro, segundo nos informa Raimundo Magalhães Júnior, que bisbilhota os lixos à procura de algo que lhe seja útil. Gandaia pode ter vindo do espanhol gandaya, derivação de gandir, comer. Os árabes, que ficaram sete séculos na Península Ibérica, têm o vocábulo gandur, peralta, travesso. Se o vocábulo é de origem controversa, a frase que o aproveita, entretanto, não deixa dúvidas sobre sua aplicação contemporânea: vive na gandaia quem não tem o que fazer. À vezes, compulsoriamente, como ocorre aos desempregados, cujo número aumenta de forma preocupante nas ditas economias modernas.
CHERCHEZ LA FEMME
"Procurai a mulher", brada o policial na sétima cena do terceiro ato da peça de Alexandre Dumas, pai (1802-1870), Os moicanos de Paris, representada pela primeira vez em 1864. Entre as 300 obras do famoso autor francês, as mais conhecidas são Os três mosqueteiros, O conde de monte Cristo e A rainha Margot. A frase tornou-se célebre em muitas línguas, sendo sempre pronunciada em francês, para indicar que em todos assuntos é necessário verificar se não há nenhuma mulher envolvida. O escritor casou-se com uma atriz de segundo time e, para esclarecimento de muitos dos problemas que enfrentou, também é necessário cherchez la femme. A esposa e as outras, pois teve várias.
COMER MORTADELA E ARROTAR PERU
Esta frase, vituperando quem se gaba do que não é, não tem ou não faz, utiliza metáfora culinária que opõe comida de pobre, a mortadela, a prato de rico ou ao menos remediado, que pode comer peru, carne de melhor qualidade. Há também algumas variantes que utilizam outro tipo de comparações, como a de comer feijão e arrotar caviar, comer sardinha e arrotar pescado. A eructação pela boca dos gazes do estômago, provindo de seus afazeres da digestão, é ansiosamente esperada pelas mães após a administração da mamadeira, mas intolerada nos adultos por ferir regra de etiqueta. Em outras culturas, porém, arrotar à mesa do anfitrião indica gesto de delicadeza e apreço pelo prato que ele ofereceu.
CONVERSA MOLE PARA BOI DORMIR
Significa assunto sem importância, esta frase nasceu quando o boi era tão importante que dele só não aproveitava o berro. Tratado quase como pessoa, com ele os pecuaristas conversavam, não, porém, para fazê-lo dormir. Nas touradas, quando o boi ainda é touro, até sua fúria compõe o espetáculo. Na copa de 1950, o Brasil venceu Espanha por 6 a 1 e quase 200 mil pessoas cantaram touradas em Madri, de Carlos Alberto Ferreira Braga, o Braguinha, que termina com este verso: "Queria que eu tocasse castanholas e pegasse um touro a unha/ caramba, caracoles/ não me amoles/ pro Brasil eu vou fugir/ isso é conversa mole/ para boi dormir".
DAR UMA BANANA
Dar uma banana para alguém é frase não só pronunciada, mas seguida do gesto de apontar o cotovelo para o interlocutor. A frase é comum no Brasil, em Portugal, Espanha e Itália, com o mesmo significado de vingança, ofensa ou desabafo. Mas a banana na expressão é ingrediente do português falado no Brasil, já que as outras línguas não ilustram o gesto com frutas. Madame Pompadour (1721-1764) encomendou um quadro ao pintor francês Joshep-Marie Vien (1716-1809) intitulado La marchand d´amours em que um dos amores aparece dando uma banana.
DEPOIS DE MIM, O DILÚVIO
Esta frase é atribuída ora ao rei Luís XV, o Bem-Amado (1710-1774), ora sua célebre amante, a marquesa de Pompadour (1721-1764), cujo nome era Antonieta de Poisson. A madame era onze anos mais velha do que o rei, discrepância de idade raramente encontrada entre pessoas de sua condição, que por norma amavam e amam homens mais velhos do que elas. O rei, que tinha um relacionamento problemático com os deputados, teria exclamado tal frase diante do parlamento francês, numa de suas notórias crises com o poder legislativo. Sua amante teria dito a mesma frase quando posava para um retrato que estava sendo feito por seu pintor preferido, entristecido pelas notícias de uma derrota sofrida pelo rei, que protegia a ambos. O dilúvio, porém, não veio nem depois dele, nem depois dela, nem depois de outros arrogantes que pronunciaram a mesma frase.
DEU DE MÃO BEIJADA
Com o significado de entrega espontânea, esta frase nasceu do rito empregado nas doações ao rei ou ao papa. Em cerimônia de beija-mão, os fiéis mais abastados faziam suas ofertas, que podiam ser terra, prédios e outras dádivas generosas. O papa Paulo IV (1476-1559), em documento de 1555, aludiu a esses meios regulares de provento sem ônus, dividindo-os em oblações ao pé do altar e de mão beijada. Desde então a frase tem sido aplicada para simbolizar favorecimentos. Nunca de mão beijada, em 1998 foi a sexta vez que o Brasil disputou a final de uma copa do mundo.
DEU UM NÓ
As origens desta frase provêm de Portugal e da Índia. Em Portugal, dar um nó era casar. E, como os vínculos do matrimônio católico, além de indissolúveis, eram e são perpétuos, quando se dizia que alguém tinha dado um nó se indicava que se havia casado. Na Índia, o nó era explícito, pois se costumava dar nó nas caudas das roupas da noiva e do noivo. Passou depois a indicar situações complicada, mas ainda como casar aparece em As variedades de Proteu, de Antônio José da Silva, o judeu (1705-1739): "E antes te aperte o nó do Himeneu/ do que na garganta te aperte outro nó".
DISCUTIR O SEXO DOS ANJOS
A origem desta frase situa-se no ano de 1453 durante a tomada de constantinopla pelos turcos. O último soberano do império Romano do Oriente, Constantino XI, comandava a resistência aos maometanos enquanto autoridades cristãs mantinham acaloradas discussões teológicas num concílio, uma das quais era se os anjos tinham ou não sexo. Não puderam chegar a conclusão. O imperador foi morto juntamente com milhares de cristãos e os novos conquistadores ali se estabeleceram sob as ordens de Maomé I. A cidade é conhecida também pelo nome de Bizâncio e Istambul. Daí dizer-se de uma discussão estéril que é bizantina. Já com a arte bizantina não acontece o mesmo. Marcada por simbolismos diversos e carregada de ornamentações, representa grande patrimônio cultural. Na arquitetura, seus dois exemplos mais famosos são a Catedral de São Marcos, em Veneza, e a de Santa Sofia, em Istambul.
DIVIDIR PARA GOVERNAR
Esta é uma das recomendações do célebre político e historiador italiano Niccolò Machiavelli (1469-1527), mais conhecido entre nós por Maquiavel, donde o adjetivo maquiavélico para caracterizar algo sem ética, feito por quaisquer meio, visando-se apenas aos fins. Suas idéias sobre o poder estão mais bem expostas num livro clássico, O príncipe. Os conselhos aos governantes são de um cinismo espantoso. Esta frase desdobra-se em prescrições desconcertantes: aos subordinados não se pode permitir que se reúnam, se conheçam e se amem. Seus outros livros incluem uma peça de teatro, A mandrágora, já encenada no Brasil.
É A OVELHA NEGRA DA FAMÍLIA
A história desta frase nasceu do trabalho de pastoreio. Em todo rebanho sempre existe aquele animal de trato difícil, insubmisso, que não acompanha o outros. Está-se cuidando das ovelhas, protegendo-as dos lobos, providenciando-lhes os melhores pastos, e de repente uma delas se desgarra. Essa é a ovelha negra. Por metáfora, a frase passou a ser aplicada nas famílias ou em outras comunidades aos filhos ou afilhados que não têm bom comportamento. Na Ilíada, Homero (século VI a.C. ) relata o sacrifício de uma ovelha negra como garantia do pacto celebrado entre Páris e Menelau, que restou na Guerra de Tróia. Mas ela não foi punida por mau comportamento. Como tantas negras, ela era inocente.
E EU ESTOU POR ACASO NUM LEITO DE ROSAS?
Cuauthémoc, também grafado Guatimozín (1497-1524), foi o último imperador dos astecas. Seu tio havia derrotado o conquistador espanhol Henán Cortés (1485-1547) na famosa Noite Triste. O derrotado, porém, reuniu as tribos descontentes com o domínio asteca e, à frente delas e de um pequeno grupo de espanhóis, venceu definitivamente o inimigo, conquistando o México. Informado de que o soberano guardava grandes tesouros em seu palácio, submeteu-o e a um dos seus ministro à tortura pelo fogo. Os dois se recusaram a falar e, quando o ministro se queixou ao imperador das dores das labaredas, este pronunciou a frase que ficaria famosa. Três anos mais tarde, o heróico soberano foi enforcado, acusado de conspirar contra os espanhóis.
EU ACUSO
Esta frase célebre, tantas vezes citada, nasceu no dia 13 de Janeiro de 1898, quando o escritor francês Émile Zola publicou uma famosa carta no jornal L´Aurore, dirigida ao então presidente da França, desmascarando o falso julgamento militar que havia sido imposto ao oficial Alfred Dreyfus, acusado de alta traição, mas na verdade condenado por ser judeu. Começava com a frase "Eu acuso" repetida em todos os parágrafos. Corajoso, o escritor acusava altas autoridades civis e militares, dando nomes e sobrenomes. Processado e condenado, o romancista refugiou-se na Inglaterra. Mas o caso Dreyfus foi reaberto e em 1906 o oficial foi considerado inocente e reintegrado pelo Exército francês. O escritor, porém, tinha falecido em 1902.
É GENTE DE MEIA-TIGELA
Em Portugal, nos tempos monárquicos, havia vários tipos de nobreza, entre os quais ganhavam destaque a nobreza territorial e a de títulos. Habitavam os palácios, porém, diversos rapazes que, dados aos serviços domésticos que executavam para autoridades, tinham direito a rações, prescrita nos livro da cozinha del rei, diligenciada pelo veador, superior do mordomo-mor. Tão logo chegavam à corte para trabalhar, moços vindos do interior eram tratados com desprezo pelos que já moravam no palácio. Não tendo direito ainda a moradia, recebiam apenas alimentação e por isso eram tratados com ironia pelos mais antigos como fidalgos de meia-tigela. Fidalgos de meia-tigela jamais quebrariam a tigela, não porque somente dispusessem da metade dela, mas porque apenas os grandes fidalgos podiam quebrar a tigela por ocasião de ritos importantes.
ELE SÓ PENSA NAQUILO
Esta frase ilustra a obsessão no mais alto grau por determinado assunto, pessoa, sentimento. Entretanto, consagrou-se no Brasil com um tempero licencioso, consolidado em programa de televisão do jornalista, ator, humorista e escritor Francisco Anísio de Oliveira Paula Filho, mais conhecido como Chico Anísio. ‘Aquilo’ funciona no português coloquial como eufemismo, suavizando palavra ou expressão ao substituí-la por outras mais polidas. A frase ficou ainda mais famosa, porém, como divertido bordão, repetido a cada programa da Escolinha do professor Raimundo pela atriz Zezé Macedo. E logo a frase caiu no gosto popular. À semelhança de outros bordões, foi incorporado ao nosso patrimônio de frases célebres.
É MAIS FÁCIL ENGANAR A MULTIDÃO DO QUE UM HOMEM SÓ
Esta frase, de proverbial sabedoria, foi escrita por Heródoto (484-420 a.C.), o Pai da História. Poucos historiadores modernos têm a graça de seu estilo, marcado pelos relatos de acontecimentos e lendas que põem em contraste a civilização grega e os bárbaros - egípcios, medos e persas: A frase deve ter-lhe brotado das muitas observações que fez entre esses povos, constatando como os grandes generais, usando a espada e a retórica, submetiam cidades inteiras, mas expunham sua franqueza num simples diálogo com um filósofo.
EROS, AMARGO E DOCE, É INVENCÍVEL
Esta frase, constantemente citada, foi extraída de um verso da célebre poetisa grega Safo (625-580 a. C.), que vivia em Lesbos, de onde se originou o vocábulo lesbianismo para designar a homossexualidade feminina, dada a figura lendária da mais notável habilidade daquela ilha. Muito antes de psicólogos, psicanalistas e sexólogos, a literatura reconheceu as forças arrebatadoras e inconscientes do desejo, moldadas nas mais diversas contradições, tal como se pode ver na frase famosa. Precursora das lutas feminista, Safo, que na verdade era bissexual, casou-se e teve uma filha, a quem comparou a um ramalhete de crisântemos. Como eram nove as musas, Platão (428-348 a.C.) escreveu que ela era a décima.
É UM NÓ GÓRDIO
Quando se quer referir-se a uma extraordinária dificuldade em determinada questão, diz-se que se trata do nó górdio do assunto. A história desta frase remonta aos tempos de Alexandre, o Grande (356-323 a. C.), senhor de um império que incluía quase o mundo inteiro. Segundo a lenda, quem desatasse o nó com que estava atada a canga ao cabeçalho de um carro feito por um camponês frígio dominaria o Oriente. O carro estava no tempo de Zeus. Do nó, feito com perfeição, não se viam as pontas. Alexandre tentou desamarrar e , não conseguindo, cortou-o com a espada. E desde então esse gesto tem servido de metáfora para designar ações ousadas para resolver problemas.
É UM PEQUENO PASSO PARA O HOMEM, MAS UM PASSO GIGANTESCO PARA A HUMANIDADE
Neil Armstrong disse esta frase famosa ao descer no mar da tranqüilidade e tornar-se o primeiro homem a caminhar na superfície da Lua. Eram 5h56min56s do dia 21 de julho de 1969 e o mundo inteiro estava de olho na televisão, que transmitia ao vivo. O segundo homem a pisar na Lua, acompanhando o comandante do módulo Eagle (águia, em inglês ) foi Edwin Aldrin Jr. Enquanto isso, na nave-mãe, a Apollo 11, o terceiro deles, Michael Collins, tornou-se o mais solitário dos homens, pois, quando estava do lado escuro da Lua, ficava sem comunicação nenhuma: nem com os dois do módulo, nem com o resto da humanidade aqui embaixo. Os três tinham a mesma idade: 39 anos.
É UM PÉ-RAPADO
No Brasil colonial, pés-rapados eram trabalhadores que produziam riqueza na lavoura e nas minas. Com seu trabalho, o rei português Dom João V (1689-1750) enchia as burras monárquicas de ouro e diamantes vindos do Brasil. Gastou fortunas em doações a ordens religiosas e foi gigantesco o esbanjamento que garantiu a vida luxuosa da corte, a ponto de o seu reino tornar-se a maior nação importadora européia. Mas erigiu também museus, hospitais e a casa da moeda, além de providenciar a canalização do rio Tejo. Tudo pago pelos pés-rapados brasileiros.
FALAI BAIXO SE FALAIS DE AMOR
A frase é um conselho do célebre dramaturgo e poeta inglês William Shakespeare (1564-1616), que se casou aos 19 anos, abandonou o lar e passou a dedicar-se ao teatro. Alguns dizem que ele nunca existiu, sendo uma invenção histórica sobre a qual muitos estão de acordo. A existência da sua obra, porém, é fácil de ser comprovada em muitos lugares do mundo, em diversas línguas e vários palcos, onde vem sendo encenado há quatro séculos. Suas peças apresentam uma variedade impressionante de personagem e temas, com destaque para o amor e a política, quase sempre entrelaçadas.
FALAR PELO COTOVELO
Esta frase significa ‘falar demais’. Tem origem nos gostos de faladores contumazes, que procuram tocar os interlocutores com os cotovelos em busca de maior atenção. O primeiro a registrar a expressão foi o escritor latino Horácio (65-8 a.C.), numa de suas sátiras. O folclorista brasileiro Luís de Câmara Cascudo (1898-1986) referiu-se ao costume das esposas no sertão nordestino de cutucar os maridos à noite, no leito conjugal, buscando reconciliação depois de alguma briga diurna. Entre os estadistas, quem mais fala pelos cotovelos é o presidente de cuba, Fidel Castro.
FOI UMA BATALHA DE TRÊS REIS
Significando luta descomunal, esta frase surgiu após a derrota dos portugueses em Alcácer-Quibir, origem do sebastianismo, crença segunda a qual o rei Dom Sebastião não morreu, mas encantou-se e um dia voltará. A famosa batalha foi travada no dia 4 de agosto de 1578 e nela os mouros perderam seus dois maiores comandantes: o sultão de Marrocos, Abde Almélique, e o mulei Mohamende Almoutauaquil. O terrível combate durou apenas quatro horas e nele morreram cerca de 8 mil portugueses e 6 mil mouros. Dom Sebastião comandava um exército de 16 mil homens. Os árabes contavam com uma força formidável: 40 mil cavaleiros e 9 mil infantes. O trono português, depois de dois anos na mãos do cardeal Dom Henrique, tio-avô do rei português, passou às rédeas de Felipe II, rei da Espanha, e só foi restaurado em 1640.
FORAM SOMENTE QUATRO OU CINCO GATOS-PINGADOS
A origem desta frase remonta a uma tortura procedente do Japão que consistia em pingar óleo fervente em pessoas ou animais, especialmente gatos. Os portugueses faziam pouco isso, mas há várias narrativas ambientais na Ásia que mostram pessoas tendo os pés mergulhados num caldeirão de óleo quente, quando não o corpo todo. Depois do suplício, assistido por poucas pessoas, tal a crueldade, passou a denominar pequena assistência, sem entusiasmo ou curiosidade, para qualquer evento. James Clave II (1920-1994) narrou o costume no livro Xogum, transposto para minissérie de televisão em 1980, já exibida também no Brasil, com Thoshiro Mifume num dos principais papéis.
GANHARÁS O PÃO COM O SUOR DE TEU ROSTO
Muito utilizada por oradores e por escritores de todos os tempos, e de uso bastante freqüente em alusão ao trabalhado, de acordo com o texto do Evangelho esta frase foi pronunciada originalmente por Deus ao expulsar Adão e Eva do paraíso terrestre. Ela foi dirigida ao primeiro homem, coroando um processo sumário conduzido por Deus que culminou em três sentenças gravíssimas. As outras duas foram dirigidas ao demônio, representado pela serpente, e a Eva. A serpente foi condenada a arrastar-se eternamente sobre o ventre, e as mulheres, a passar pelos sofrimentos no partos.
HOUVE MUITOS PAPAS E UM ÚNICO MICHELANGELO
Esta frase foi pronunciada pela primeira vez pelo célebre pintor, escultor, arquiteto e poeta italiano Michelangelo Buonarotti (1475-1564), autor de algumas das principais obras-primas da arquitetura e da arte sacra em todos os tempos, entre as quais se destacam a cúpula da Basílica de São Pedro, em Roma, e os famosos afrescos da capela Sistina. O artista vivia às turras com o papa Júlio II (1443-1513), que, entretanto, protegeu, além de Michelangelo, outros grandes pintores e arquitetos, como Rafael (1483-1520) e Bramante (1444 -1514), e foi numa de suas brigas com o sumo pontífice que pronunciou a frase que ficaria famosa. Ao ouvir a frase, o papa deu uma bolacha na face do artista.
INÊS É MORTA
Personagem histórica e literária, celebrada em Os lusíadas, de Luís de Camões (1524-1580), Inês de Castro (1320-1355) teve um caso com o príncipe Dom Pedro (1320-1367), com quem teve três filhos. Por reprovar o romance, a casa real condenou a dama castelhana que vivia na corte portuguesa à morte por decapitação. Ela literalmente perdeu a cabeça por um homem. Quando já era o oitavo rei de Portugal, Dom Pedro deu-lhe o título de rainha. Mas àquela altura logicamente isso de nada adiantava: Inês já estava morta. A frase passou a significar a inutilidade de certas ações tardais. É o título de romance do mineiro Roberto Drummond.
MAS ISTO FALA!
Exclamação atribuída a Dom Pedro II ao experimentar o aparelho apresentado pelo físico e professor de surdos-mudos Alexandre Grahan Bell (1847-1922), um dos inventores do telefone, em 1876. Nosso último monarca e também o derradeiro da América costumava dar uma curiosa atenção às novas tecnologias, ciências e letras no meio século em que governou e reinou no então Império do Brasil. Mas ficou com o telefone quase só para ele, de tão interessante que o considerou.
MEU REINO POR UM CAVALO
O dramaturgo e poeta inglês William Shakespeare (1564-1616) criou um teatro cheio de reis dramáticos. Em suas peças, o poder está sempre presente e os elementos políticos cumprem funções decisivas. São célebres muitas frases proferidas por seus personagens, como "Ser ou não ser, eis a questão" , "Há algo de podre no reino da Dinamarca" e "Meu reino por um cavalo". Esta última é pronunciada duas vezes pelo rei usurpador, em suas duas únicas falas na cena quatro do quinto ato da peça Ricardo III, ao perder seu cavalo e ser derrotado pelo duque de Richmond na batalha de Bosworth.
MISTURAR ALHOS COM BUGALHOS
Frase que sintetiza confusão, é de uso corrente na linguagem coloquial desde os tempos dos primeiros cultivos do alho, erva de que se aproveita o bulbo, principalmente como tempero. Os namorados, entretanto, procuram evitar pratos com tal condimento, já que o beijo fica mais adequado ao trato com vampiros e não com os amados, dado ao cheiro pouco agradável advindo de sua metabolização no organismo. Com o sentido de coisas desconexas e trapalhadas, foi registrada por João Guimalhões Rosa num de seus contos: "O senhor pode às vezes distinguir alhos de bugalhos, e tassalhos de borralhos, e vergalhos de chanfalhos, e mangalhos... Mas, e o vice-versa?" Com sua escrita plena de complexidades e sutilezas, o maior escritor brasileiro do século XX misturou muito mais do que alhos com bugalhos, criando novas palavras ao manter alho como sufixo de diversas outras, aproveitando a coincidência fonética de ‘bugalho’, do celta bullaca (conta grande de rosário, noz), rimar com alho, além de designar coisa parecida na forma.
MORRO PELA MINHA PÁTRIA COM A ESPADA NA MÃO
Última frase pronunciada pelo estadista, ditador e militar paraguaio Francisco Solano López (1826-1870), à beira do riacho Aquidabam, ferido de morte pelo soldado brasileiro Chico Diabo e antes de receber o tiro de misericórdia, disparado pelo gaúcho João Soares, contrariando ordens de seu superior, que ordenou a seus comandados que a capturassem vivo. A frase foi pronunciada no dia 1º de março de 1870 e marcou o fim da Guerra do Paraguai. A espada de Solano López estava com a ponta quebrada, curiosidade que foi registrada pelo comandante-chefe das operações, o Conde d’Eu (1842-1922), em carta enviada a Dom Pedro II (1825-1891), de quem era genro, pois era casado com a princesa Isabel (1846-1921). Curiosidade maior marcou o fim dos vencedores: o pai, a filha e o genro morreram no exílio, sem espadas na mão e desprezados pela pátria que haviam adotado, o Brasil.
NÃO SABE NEM O DÓ, RÉ, MI
Para tachar alguém da analfabeto, diz-se que "não sabe nem o ABC". A frase serve para designar quem nada entende de música. As denominações para as notas foram dadas pelo musicólogo italiano Guido D’Arezzo (990-1050), que se inspirou nas primeiras sílabas de um hino a São João, o Evangelista, composto em latim por um cantor de igreja que estava resfriado. Nele o cantor pedia ao santo que lhe devolvesse a voz. Os seis versos começavam com ut, re, mi, fa, sol, la. A primeira nota mudou para dó, permanecendo ut apenas para os eruditos. E a última, si, foi formada com as iniciais do nome do santo em latim: Sancte Joannes. Em latim, o ‘jota’ tem som de ‘i’. A oração tem o seguinte teor: "Ut queant laxis/ Resonare fibris/ Mira gestorum/ Famili tuorum/ solve polluti/ Labii reatum/ Sanctre Joannes" ("Purifica os nossos lábios culpados, a fim de que teus servos possam celebrar a plena voz as tuas maravilhas, ó São João").
NAS REVOLUÇÕES, O DIFÍCIL É SALVAR A PORCELANA
Esta frase é de autoria do político francês Georges Clemenceau (1841-1929), deputado-chefe da esquerda radical a partir de 1875, senhor de uma eloqüência arrebatadora. No primeiro decênio deste sêculo, já presidente do conselho de ministro, rompeu com os socialistas. Era temido também por ser um derrubador de ministério e, dada a sua notável valentia, recebeu o apelido de Tigre. Deposto, voltou ao poder em 1917, dedicando-se à continuação da Primeira Guerra Mundial. Depois da vitória, tornou-se muito popular e negociou o Tratado de Versalhes. A frase indica que em mudanças radicais, como é o caso das revoluções, alguma coisa muito preciosa se perde. Em geral, a porcelana é a liberdade.
O AMOR É UMA ENXAQUECA UNIVERSAL
A frase é do poeta, romancista e ensaísta inglês Robert von Ranke Graves (1895-1985), autor de mais de 120 livros, que incluem pesquisas reveladoras de importante religião baseada na figura de uma deusa branca, cuja adoração teria existido ainda no cristianismo. Outros livros seus muito conhecidos são uma autobiografia sobre sua participação na primeira guerra mundial, em que foi gravemente ferido, e o romance Eu, Cláudio, narrado pelo famoso imperador romano, que tão pouco amou. Seus sofrimentos não o impediram de escrever notáveis livros de poemas, tratando de sentimentos profundos, vividos num século que fez mais a guerra - duas mundiais - do que amor.
O AMOR QUE NÃO OUSA A DIZER SEU NOME
Identificando a homossexualidade, esta frase, muito citada, é um verso do poema "Dois amores", de autoria do lorde inglês Alfred Douglas (1870-1945), escritor de reconhecidos méritos que influenciou até mesmo o francês André Gibe (1869-1951), prêmio Nobel de literatura em 1947. O lorde foi um dos muitos jovens aristocratas britânicos a ter caso com o escritor inglês Oscar Wilde (1854-1900). Entretanto, quando se tratou de punir as práticas homossexuais de todos ele, o autor de O retrato de Dorian Gray e A alma do homem sob o socialismo, foi o único a ser condenado à prisão pelo amor que não ousava dizer seu nome, já que seus amados também não ousaram declarar-se.
O ESCRITOR É IRMÃO DE CAIM E PRIMO DISTANTE DE ABEL
Esta frase, inspirada na história bíblica de Caim - filho mais velho de Adão e Eva, que matou o irmão Abel -, é o penúltimo haicai da série de 123 que constam de um folheto distribuído a algumas pessoas em 1993 pelo escritor curitibano Dalton Trevisan e posteriormente reunidos em livro publicado pela Editora Record com o título de Ah, é? Conciso, lacônico, avesso a entrevista, o ficcionista de reconhecido talento tem espelhado essa concepção amarga da literatura nos seus mais de 20 livros publicados, que lhe valeram prêmios e traduções para diversas línguas.
O REAL NÃO ESTÁ NEM NA SAÍDA NEM NA CHEGADA: ELE SE DISPÕE PARA A GENTE É NO MEIO DA TRAVESSIA
Eis uma frase que poderia ser inscrita na nova moeda brasileira, o real. É da autoria do grande escritor mineiro João Guimarães Rosa (1908-1967). Foi profecia pelo jagunço letrado Riobaldo no célebre Grande Sertão: veredas, publicado pela primeira vez em 1956 e levado à televisão com Bruna Lombardi no papel, misterioso e repleto de sutis complexidades, de Diadorim. Guimarães Rosa recomendava a quem já tinha lido o livro que não revelasse o grande segredo do romance, envolvendo Riobaldo e Diadorim, porque, como sugere a frase, no desfecho do romance é que os leitores entendem melhor algumas de suas passagem mais memoráveis.
O SENHOR COMBINOU COM OS ADVERSÁRIOS?
Esta frase lendária entrou para o folclore do futebol como tendo sido dita por Garrincha (1933-1983) após ouvir a preleção do técnico Vicente Feola (1909-1975) sobre o esquema de jogo contra a então União Soviética na Copa de 1958. Garrincha, tido por simplório, mas um dos maiores jogadores de todos os tempos, fez uma pergunta que, por sua lógica absurda, desconcertou a todos. Segundo ele, do modo como o técnico explicava, para o esquema dar certo era indispensável a ajuda dos adversários. No primeiro minuto de jogo, Garrincha esqueceu os planos, driblou meio mundo e chutou na trave. Diante do carnaval que fez, a derrota por 2 a 0 saiu barata a URSS.
OS NEGÓCIOS SÃO O DINHEIRO DOS OUTROS
Esta frase, tornada proverbial, aparece em A questão do dinheiro, comédia do escritor francês Alexandre Dumas Filho (1824-1895), também autor de A dama das camélias. É pronunciada na cena sete do segundo ato. A frase desagradou um importante banqueiro francês, que atacou o autor pelos jornais. O teatrólogo respondeu com ironia, também pela imprensa: "Quando quiser uma peça honesta, pedirei seus conselhos; quando você fizer uma operação bancária honesta, pedirei ações". Filho natural de Alexandre Dumas (1802-1870), suas obras obtiveram grande sucesso de público, mas algumas foram proibidas várias vezes. As do banqueiro, não.
PARIS VALE UMA MISSA
Quem pronunciou esta frase pela primeira vez, inaugurando o significado que carregaria pelos séculos seguintes, foi Enrique IV (1553-1610), rei de Navarra e posteriormente da França. Por achar que Paris valia uma missa, abjurou o protestantismo duas vezes, tornando-se católico por conveniência. Primeiro, para casar-se com Margarida de Valois, a rainha Margot (1553-1615), a quem posteriormente repudiou. Escapou do massacre da noite de são Bartolomeu, tonou-se rei da França, voltou ao protestantismo e depois tornou a abjurá-lo por motivos políticos. Morreu assassinado. Paris valeu-lhe outras tantas missas, mas por sua alma. O significado da frase é que vale qualquer sacrifício quando o objetivo é essencial.
PENTEAR MACACOS
Esta frase, proferida como ofensa, é adaptação brasileira de um provérbio português: "Mau grado haja a quem asno penteia". Na tradição de Portugal, pentear burros e jumentos seria tarefa menor, quase desnecessária. Provavelmente o verbo significava escovar, um luxo para animais de carga. Mas no século XVIII, o animal já havia sido substituído por bugio em Portugal e por macaco no Brasil, tal como aparece em documentos de 1756 assinado pelo rei Dom José (1714-1777), que deve ter penteado muitos macacos, já que quem exercia o poder era o marquês de Pombal (1699-1782), que, inclusive, transferiu a capital do Brasil de Salvador para o Rio de Janeiro. A expressão está registrada por Luís da Câmara Cascudo (1898-1986) em Locuções tradicionais do Brasil.
PÔR EM PRATOS LIMPOS
O primeiro restaurante foi aberto na frança em 1765. Estabeleceu-se desde o início que a conta seria paga após a pessoa comer, ao contrario do que depois veio a acontecer com os lanches rápidos. Quando o dono ou o garçom vinha cobrar a conta e o cliente ainda não havia feito a refeição, os pratos limpos eram a prova que ele nada devia. A frase passou a servir de metáfora na resolução de conflitos. Quem gostava de pôr tudo em pratos limpos, com "a alma lavada e enxugada", era o personagem Odorico Paraguaçu, criado por Dias Gomes em O bem-amado e vivido por Pelópidas Gracindo, mais conhecido como Paulo Gracindo (1911-1995).
PRIMEIRO VIVER, DEPOIS FILOSOFAR
Esta frase integra proverbiais sentenças latinas e está registrada em Leviatã, livro publicado em 1651, que viria a transformar-se na grande obra do filósofo inglês Thomas Hobbes (1588-1679), um velhinho que teve muito o que nos ensinar. Em seus textos, defendeu a desobediência quando as leis impostas contradizem as leis naturais, mas ao mesmo tempo defende o Estado como elemento coercitivo que leva ao bom comportamento dos homens. Foi, assim, um partidário do despotismo político, do materialismo filosófico e do egoísmo moral. Pregou o recurso o racionalismo contra as imposições vindas de autoritarismo religiosos. Escrevia em latim e se interessava muito por literatura, tendo traduzido para o inglês a Odisséia. A frase foi originalmente escrita em latim: "Primum vivere, deinde philosophare".
QUANDO NÃO SOMOS INTELIGÍVEIS É PORQUE NÃO SOMOS INTELIGENTES
Frase do grande escritor francês Victor Hugo (1802-1885), autor de romances memoráveis, de grande sucesso de crítica e público. Estreou, porém, com um livro de poesias clássicas aos 20 anos. Talvez por ser também poeta soube conciliar na prosa o interesse de leitores e o refinamento da linguagem, sem relaxamento dos padrões estéticos. Entre seus romances mais conhecidos no Brasil estão Os trabalhadores do mar e Os miseráveis. Era adepto da clareza de estilo, conforme ilustra a frase acima. E o poeta Gaúcho Mário Quintana, que traduziu algumas de suas obras, emitiu juízo semelhante: "Quando o leitor não entende o que o escritor escreve, um dos dois é burro".
QUANDO OS REIS ENLOUQUECEM, OS GREGOS APANHAM
Não foram poucas as vezes em que um povo sofreu amargamente por causa das loucuras daqueles que o governavam. A história mostra-nos grandes desastres e humilhações sofridos nas diversas épocas por empreendimentos delirantes em que apenas um homem tomou a decisão, mas todos pagaram pelas conseqüências. Foi o caso de numerosas guerras que resultaram no sofrimento e na morte de milhões de pessoas. As frases do poeta latino Horácio (65-8 a.C.) foram pronunciadas a propósito da Guerra de Tróia, que durou dez anos, segundo a Ilíada, de Homero (século XIX a.C.). Apesar de terem enganado os troianos com o famoso cavalo de madeira cheio de guerreiros, os gregos sofreram muito com essa e outras guerras.
QUEM NÃO ESTÁ CONOSCO, ESTÁ CONTRA NÓS
Esta frase nasceu dos evangelhos. São Mateus, em seu capítulo 12, versículo 30, e São Lucas, no capítulo 11, versículo 23, a registram como tendo sido dita por Jesus, usando os pronomes no singular: "Quem não esta comigo, está contra mim". Mas foi o ditador da Itália Benito Mussolini (1883-1945) quem a passou para o plural, proclamando-a num momento decisivo do fascismo e tornado-a lema de suas ações num teatro de Roma, em 1924, dois anos depois de ter subido ao poder. Também os integralistas brasileiros copiaram o dito do duce, adaptando-o aos seus propósitos, muito semelhantes ao fascismo italiano. Muitos, porém, estavam contra os fascismo. No fim eles ficaram sozinhos e foram vencidos, apesar de terem liderado movimentos capazes de arrebatar multidões.
QUEM NÃO SE COMUNICA SE TRUMBICA
Esta frase é de autoria do maior animador de auditórios da televisão em todos os tempos, um gênio em seu ofício, o médico Abelardo Barbosa, mais conhecido como Chacrinha (1918-1988). Não apenas cunhou a frase, como foi o primeiro a seguir o que ensinava, destacando-se em diversas redes de TV como comunicador de méritos notáveis, sempre imitado e jamais igualado. Sua influência nos meios de comunicação de massa estendeu-se também à língua portuguesa, resultando em alguns neologismos, de que é exemplo o termo chacrete, designando as bailarinas que faziam a coreografia de seus programas.
QUE SEJA EM NOME DE DEUS
Em nossa civilização ocidental e cristã, Deus nem sempre foi invocado para atos dos quais a humanidade possa orgulhar-se. Muitas barbaridades já foram cometidas em seu nome, apesar de um dos mandamentos ordenar que não seja invocado o seu nome santo em vão, quanto mais para sancionar atos perversos. Um dos piores exemplos de tal inovação está no filme Em nome de Deus, dirigido por Clive Donner, cujo o tema é a história de amor vivida por Abelardo (1079-1142) e Heloísa (1101-1164), cujos corpos repousam hoje lado a lado no cemitério Pére Lachaise, em Paris. Abelardo tinha 39 anos e Heloísa, sua aluna, 17, quando se apaixonaram perdidamente, tendo vivido linda e trágica história de amor. Naquele tempo, as escola ainda eram anexos das sacristias e era exigida a castidade dos docentes. Culto e inteligente, Abelardo conhecera Heloísa por mãos do tio dela, o cônego Fulbert. Tendo a moça engravidado, Abelardo resolveu abandonar a ordem religiosa e desposá-la. Não havia impedimento nenhum, já que ele não recebera ainda as ordens maiores, mas a família da moça não aprovou a solução. Indignado, o cônego contratou bandidos para prender e castrar Abelardo. Depois de recluso num convento, Abelardo escreveu várias obras de teologia. Denunciado como herético, foi levado a um tribunal presidido por são Bernardo (1090-1153), conselheiro de reis e papas e pregador da segunda cruzada. O resultado foi sua condenação. Abelardo recorreu a Roma e morreu durante o julgamento de sua apelação. Quanto a Heloísa, também entrou para um convento, do qual foi madre superiora, tendo vivida ainda 22 anos depois da morte do amado. Nunca mais teve outro amor. Pudera! O primeiro que viveu teve conseqüencias terríveis para o amado e, indiretamente, para ela também, claro, já que ainda não havia prótese. O próprio Abelardo narrou seus infortúnios no livro Histórias de minhas desgraças. François Villon e Eugene Scribe, entre outros, escreveram sobre o tema. Há também diversas biografias desses amantes que protagonizaram uma das mais célebres história de amor.
QUEM VAI PÔR O GUIZO NO PESCOÇO DO GATO?
A história desta frase remonta a uma das célebres fábulas do escritor francês Jean de la Fontaine (1621-1695) e tem aparecido constantemente em situações delicadas. Era muito citada pelo famoso político brasileiro Ulysses Guimarães (1916-1992), que presidia a câmara dos deputados quando foi promulgada a atual constituição, a cada vez que os parlamentares decidiam algo difícil de executar. De acordo com a fábula, os ratos resolvem em assembléia pôr um guizo no pescoço do gato, o eterno inimigo. Assim, eles perceberiam a tempo a sua aproximação e fugiriam a cada ataque. Um rato velho, calado durante todo o tempo, endossou o plano, mas fez a pergunta que se tornou famosa, dando conta de que entre as palavras e as ações há uma certa distância, às vezes intransponível.
RASGAR SEDA
A sabedoria popular costuma resumir seus ensinamentos em diretos e provérbios, quase sempre ligados a acontecimentos da vida cotidiana, mas sua permanência na memória depende dos registros escritos. Com a frase acima, não se deu diferente. Foi sempre sinônimo de elogios exagerados e está presente numa das comédias do fundador do teatro de costumes no Brasil, o dramaturgo Luís Carlos Martins Pena (1815-1848), em cena na qual um vendedor de fazendas vai à casa de uma moça para cortejá-la e, como pretexto, oferece-lhe alguns panos "apenas pelo prazer de ser humilde escravo de uma pessoa tão bela". Retruca a moça: "Não rasgue a seda, que esfiapa-se".
RICO RI À TOA
É provável que esta frase tenha sido cunhada do Rio de Janeiro, dada a conhecida verve dos cariocas. Transformada mais tarde em bordão de programas de rádio e televisão, foi também título de um filme. Um de seus registros mais notáveis foi feito pelo jornalista e poeta Paulo Mendes Campos nos anos 40, ao receber uma foto do presidente Getúlio Vargas (1883-1954) para legendar. Como de hábito, Vargas estava sorrindo, enquanto nas rádios tocava conhecida marchinha que dizia: "Bota o retrato do velho outra vez/ bota no mesmo lugar/ sorriso do velhinho faz a gente trabalhar". Ao ver sua foto com a legenda "Rico ri à toa", o próprio presidente achou graça no feito do poeta-jornalista.
SABER É PODER
Caiu na boca do povo esta frase que dá conta dos poderes do saber. Foi originalmente escrita pelo filósofo e chanceler inglês Francis Bacon (1561-1626), um dos criadores do método experimental nas ciências. Foi ele quem tornou a pesquisa independente do princípio da autoridade e do método dedutivo ao formular sua teoria da indução. No século XVI, as finalidades sociopolíticas do saber não eram tão óbvias como atualmente, sendo o filósofo um precursor nessa questão, dando importância social aos conhecimentos científicos. É frase especialmente significativa no Brasil contemporâneo, já que o saber é e está no poder com o sociólogo Fernando Henrique Cardoso.
SAIR À FRANCESA
O significado desta frase é sair de uma festa ou cerimônia sem se despedir. Pode ter origem em costume francês ou na expressão "saída franca", indicando mercadorias sem impostos, que não precisam ser conferidas. Como os franceses primam justamente pela etiqueta, não concordaram com a frase e a mudaram para "sair à inglesa". Alguns pesquisadores situam o surgimento da expressão na época das invasões napoleônicas na Península Ibérica (1810-1812), mas o escritor português Nicolau Tolentino de Almeida (1740-1811), cuja poesia satírica visava aos usos e costumes de Lisboa, registrou-a muito antes nestes versos: "Sairemos de improviso/ despedidos à francesa".
SÃO TODOS FARINHA DO MESMO SACO
Esta frase, que tem o fim de desmascarar pessoas que fingem ser o que não são, nasceu de uma metáfora que compara os homens aos trigos e seus derivados. A farinha de boa qualidade é posta em sacos separados para não ser confundida com a de qualidade inferior. Quando indivíduos falsos se arrogam em críticos severos de outros de quem podem ser na verdade cúmplices, sócios ou amigo, surge esta frase para dar conta de que não há diferença entre eles. Originalmente apareceu em latim: "Homines sunt ejusdem farinae" (são homens da mesma farinha). O famoso escritor francês Honoré de Balzac (1799-1850) usa a expressão com freqüência em seus romances: "C’est sont des gens de la même farine", que em português foi traduzida com leve alteração.
SE DUVIDAS DE TI MESMO, JÁ TE VENCERAM ANTECIPADAMENTE
Esta frase é de autoria do famoso dramaturgo e poeta norueguês Henrik Johan Ibsen (1828-1906), que escreveu célebres peças de teatro, várias delas encenadas também no Brasil, como Peer Gynt, Casa de bonecas e O pato selvagem. Depois de muito trabalho e de ele perambular por várias cidades européias, seus escritos tiveram influência decisiva na cultura ocidental, a ponto de seu nome prestar-se ao estabelecimento do ibsenismo, atitude intelectual marcada pela condenação das hipocrisias sociais, que encontraram em seu teatro realista e moderno a sua melhor expressão artística. O dramaturgo teve uma vida atribulada. Ainda que não houvesse a estrutura da casa-grande e da senzala na Noruega, aos 18 anos ele teve um filho ilegítimo com uma das empregadas de sua família.
SER HOMEM DE BOA – FÉ
No capitólio romano havia o tempo da Bona Fides, Boa Fé, cuja festa era celebrada a 1º de outubro. Transações privadas precisavam ter fides publica, fé publica, que garantia a convivência social mediante a confiança que os cidadãos deveriam ter uns nos outros. Os que ali faziam promessas e depois as descumpriam, ainda antes da sistematização do direito, eram pessoas de má-fé, expressão que atravessou os séculos e ainda é usada. Já ser homem de boa-fé é ser pessoa de bem, em cuja palavra se pode confiar, ainda que designe também o homem simples, que em boa-fé pode ser enganado pelo de má-fé. Marco Túlio Cícero (106-43 a.C.) registrou a expressão numa de suas famosas orações.
SIGAM-ME OS QUE FOREM BRASILEIROS
Esta frase foi pronunciada por Luís de Lima e Silva, o duque de Caxias (1803-1880), patrono do exército brasileiro, em momento dos mais dramáticos e decisivos da guerra do Paraguai, a Batalha de Itororó, em 4 de Dezembro de 1866. Era vital para as tropas aliadas atravessar o rio Itororó, mas os paraguaios infligiam numerosas baixas aos brasileiros. À beira da derrota, Caxias desembainhou a espada, gritou a frase com entusiasmo descomunal, tomou a dianteira, atravessou a ponte, acompanhado por toda a tropa, e venceu a batalha. As perdas brasileiras foram de 1864 homens, entre os quais havia 45 oficiais.
SOMENTE O TRABALHO GARANTE À MULHER UMA LIBERDADE COMPLETA
Os anos de pós-guerra trouxeram um novo olhar sobre as mulheres. Para as mudanças que se seguiram foi fundamental a reflexão da própria mulher sobre a condições femininas e suas sutis complexidades. Os novos reconhecimentos sociais obtidos pelas lutas femininas levaram a uma redefinição dos papéis ocupados pelas mulheres em fábricas, empresas e universidades. A francesa Simone de Beauvoir (1908-1986), autora desta frase, foi uma das principais responsáveis pelas novas conquistas, exercendo influência decisiva sobre homens e mulheres com seus livros e seu estilo de vida. Reconhecida como romancista, foi, porém, com um audacioso estudo sobre a mulher, O segundo sexo (1949), que obteve sucesso internacional.
SURDO COMO UMA PORTA
As paredes tem ouvidos, mas as portas são surdas. Os antigos romanos faziam suas oferendas à deusa porta, suplicando-lhe favores, beijando-a, molhando-a com lágrimas, perfumando-a e enfeitando-a com flores. Tinham também o costumes de gritar diante de uma porta fechada, dirigindo-lhe injúrias para desabafar, o que faziam também à própria deusa quando não tinham seus pedidos atendidos. O escritor romano Festus registra o costume, denominando occentare ostium (injuriar a entrada, a porta), que vigorou ainda por vários séculos durante a era cristã. No Brasil pode ter havido influência das cancelas e portões cujos gonzos emperravam e impediam o som das portas, que era sinal de que estavam funcionando bem. Porta surda era aquela que não podia ser aberta, a não ser com muita dificuldade. O poeta brasileiro Alberto de Oliveira (1857-1937) atribuiu sentimento e inteligência a porta no soneto "A vingança da porta". Os ingleses acham que surda é apenas a maçaneta: "deaf as a door knob". E os franceses, sempre preocupados com a culinária, dizem "sourd comme un pot" (surdo como uma panela).
TEM PAI QUE É CEGO
Esta frase tornou-se famosa por expressar a superproteção paterna que impede o pai de ver o que realmente se passa com seus filhos. Consolidou-se em programa de televisão do jornalista, ator, humorista e escritor José Eugênio Soares, mais conhecido como Jô Soares, que representa o pai excessivamente indulgente com seu filho. Com sua verve habitual, Jô encarnava um personagem que não via certas tendências do rebento, apesar de o comportamento do filho demonstrar o contrário do que apregoava. Durante muito tempo foi divertido bordão dos programas O planeta dos homens, Veja o gordo, Viva o gordo. Atualmente Jô, que consegue conciliar humor com refinamento cultural e popularidade, apresente o programa Jô Soares onze e meia no SBT.
TODA A VERDADE DEVE SER REINVENTADA
Esta frase é do psicólogo e educador suíço Jean Piaget (1896-1980). Suas teoria sobre o desenvolvimento do pensamento e da linguagem no homem tiveram efeitos profundos na educação neste século. Dono de inteligência deslumbrante, publicou os resultados de sua primeira pesquisa aos 10 anos e aos 22 já era doutor em biologia. Sua obra inclui a publicação de 70 livros e 300 artigos. Aos que perguntavam de onde tirava tempo para escrever tanto, respondia que não precisava ler Piaget. Era uma forma bem-humorada de reconhecer que seus escritos eram de leitura indispensável.
TODO PODER EMANA DO POVO E EM SEU NOME É EXERCIDO
Esta frase compõe o primeiro parágrafo de várias constituições brasileiras e estão presentes também na que está em vigor, promulgada a 5 de outubro de 1988, que substituiu a de 1967, maculada por atos institucionais. A primeira foi outorgada em 1824 por dom Pedro I. A seguinte, de 1891, já foi republicada e pautou-se na dos Estados Unidos, em que o presidente é figura com mais poderes do que um imperador. Seguiu-se a de 1934, substituída pela de 1937, outorgada por Getúlio Vargas. A de 1988, como a de 1946, foi fruto de uma constituinte. As fases lembram que os poderosos estão em seus cargos a serviço do povo.
TRISTEZA NÃO PAGA DÍVIDAS
Esta frase já fora registrada no século XVII, mas tornou-se ainda mais popular nos anos 40 deste século quando o famoso ator, compositor e comediante Oscar Lourenço Jacinto da Imaculada Conceição Tereza Dias, mais conhecido como Oscarito (1906-1970), o rei das chanchadas das lendária companhia cinematográfica Atlântica, estreiou um filme com este título. Era a primeira das 35 comédias musicais em que atuou. O sentido da frase é que as pessoas em dificuldades financeiras não devem entristecer-se. O povo brasileiro acolheu este provérbio como nenhum outro. Somos um povo alegre e devemos uma barbaridade. Somadas, nossas dívidas externas e internas passam dos 400 bilhões de dólares.
TUDO NOS TRINQUES
Estar nos trinques ou andar nos trinques significa vestir-se com elegância. Alguns pesquisadores deram como origem a palavra francesa tringle, cabide, que no Brasil passou a ser pronunciada e grafada como trinque, significando o móvel em que os alfaiates penduram as roupas já prontas que os clientes ainda não vieram buscar. Com o sentido de vestir-se com apuro, aparece no causo "Contrabandista", do livro Contos gauchescos e Lendas do sul, de Simões Lopes Neto: "Surgiu dum quarto o noivo, todo no trinque, de colarinho duro e casaca de rabo". Mas é possível que tenha havido mistura com o também francês trinquer, brindar tocando os copos, já que em tais ocasiões as pessoas estariam bem vestidas. Em Direito por linhas tortas, de Joaquim José da França Júnior, o personagem Feliberta recebe a seguinte recomendação: "Hás de andar no trinque, metendo inveja a essas sirigaitas, que não te chegam aos calcanhares".
ÚLTIMA FLOR DO LÁCIO, INCULTA E BELA
Esta frase, utilizada para denominar a língua portuguesa, é o primeiro verso de um célebre poema de Olavo Bilac (1865-1918), cujo nome completo forma um decassílabo: Olavo Brás Martins dos Guimarães Bilac. A flor é a língua portuguesa, a última das filhas do latim. É inculta por descuido de seus filhos, mas é bela porque todos reconhecem a delicadeza de suas expressões, principalmente na fala, dadas as contribuições que recebeu dos novos falantes de além-mar, no Brasil, como na África e na Ásia. A região do Lácio, localizada às margens do mar Tirreno, na Itália, foi subjugada pelos romanos no século IV a.C. Uma boa mostra de quanto a última flor do Lácio continua inculta são os programas apresentados no rádio e na televisão no horário eleitoral.
UMA ANDORINHA NÃO FAZ VERÃO
Esta frase, que traz em sua origem a necessidade da cooperação entre todos, tornou-se ainda mais popular depois do carnaval de 1934, quando foi verso-título de uma das célebre marchinhas de Lamartine de Azevedo Babo (1904-1963), com melodia do também famoso compositor, cantor e autor de roteiros cinematográficos, Carlos Alberto Ferreira Braga, um carioca mais conhecido sob os pseudônimos de João de Barro e Braguinha. Apesar da letra lírica, mas irônica, a música tinha um tom já nostálgico naqueles anos: "O povo anda dizendo que esta luz do teu olhar a Light vai mandar cortar". Os dois compositores dominaram os carnavais brasileiros por várias décadas, sendo autores de muitos outros sucessos.
UM GÊNIO COMPÕEM-SE DE 2 POR CENTO DE TALENTO E 98 POR CENTO DE TRABALHO
Esta frase, que depois passou a ser citada com freqüência, foi originalmente pronunciada pelo célebre músico e compositor alemão Ludwig Beethoven (1770-1827), que deu boas razões para passarmos a acreditar em seu famoso provérbio. Com efeito, mesmo sendo o gênio que era, trabalhou duramente para nos embevecer e deixou uma obra musical que incluiu 32 sonatas para piano, 17 quartetos, 9 sinfonias, 5 concertos para piano e 1 para violino, sem contar sua célebre ópera Fidélio, a Missa solene e diversas aberturas. O grande músico, que tanto trabalhou, teve ainda que enfrentar uma surdez que o atacou muito cedo.
VENCEREIS, MAS NÃO CONVENCEREIS
Esta frase, que depois se tornaria mais que famosa, lendária, foi pronunciada pelo professor e escritor espanhol Miguel de Unamuno, então reitor da universidade de Salamanca, em outubro de 1936, interrompendo o discurso de um general franquista que deu o seguinte viva: "Morra a inteligência!" O magnífico surpeendeu a todos, principalmente os que aplaudiam o militar, pronunciando a frase e acrescentando: "Este é o templo da inteligência e eu sou seu sumo sacerdote. Vencereis porque tendes força bruta, mas não convencereis porque convencer significa persuadir e para isso necessitais algo que não tendes: razão e direito". O reitor foi destituído e morreu no dia 31 de dezembro.
VIGIAI E ORAI
A história desta frase prende-se aos Evangelhos, na famosa recomendação de Jesus aos discípulos, alertando-os de que permanecessem vigilantes. O sono foi sempre um inimigo duro de vencer e os discípulos estavam dormindo quando soldados romanos vieram prender os mestres. O imperador Vespasiano (9-79) já era comandante militar poderosíssimo quando dormiu durante um cortejo. O rei da Grã Bretanha Eduardo VIII, duque de Windsor (1894-1972), conta em Memórias de um rei que vários soberanos dormiam no desfile e eram acordados pelas mulheres para saudarem o súditos. Políticos de todos os países são freqüentemente surpreendidos em cerimônias importantes por fotógrafos ou câmeras que flagram o sono indevido. Nessas horas, quem deve vigiar é o fotógrafo ou o câmera.
VIVER É LUTAR
Quem popularizou esta frase no Brasil foi o poeta romântico Antônio Gonçalves Dias (1823-1864), que fez do índio o grande personagem de sua obra. A frase foi transformada em verso no famoso poema "Y-Juca-Pirama", em que são destacadas a coragem e a pertinácia dos guerreiros indígenas. O verso funciona como conclusão dos anteriores, que advertem: "A vida é combate/ que os fracos abate". Antes, porem, que o escritor tivesse aproveitado a expressão em sua obra, o filósofo latino Sêneca (4 a.C. –65 d.C) fizera seu registro, também como recomendação, numa de suas obras Epístolas morais a Lucílio: "Vivere militare est", cuja a tradução literal resulta exatamente na frase cunhada pelo brasileiro.
VOSSA AMIZADE É MUITO CARA
Os velhos, dado um saber de experiência feita, sempre deram grandes lições à humanidade. A história desta frase famosa envolve duas grandes figuras: o imperador Napoleão I (1769-1821) e o papa Pio VII (1742-1823). O primeiro, para quem a autoridade máxima da Igreja católica era apenas um velho a mais, estava mandando em meio mundo e só não conseguia subjugar o papa, a quem, entretanto, encarcerou por duas vezes. "Todos os poderes da Europa obedecem às minhas ordens, menos você, que recusa a minha amizade", disse o imperador, que confundia amizade com obediência. O pontífice respondeu com esta frase que se tornaria célebre.
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