Discurso de Lula da Silva (excerto)

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segunda-feira, 22 de agosto de 2011

Freedom e Rainbow - encontros muito alternativos em Elvas e Montalegre

Correio da Manhã


Tema de capa

Um mundo à parte

Freedom e Rainbow são palavras inglesas para designar 
encontros muito alternativos em Elvas e Montalegre
Por:Catarina Gomes de Sousa / Pedro Galego / I.F.
A "grande família", como a organização gosta de chamar aos clientes de um dos mais alternativos festivais de música do País, junta-se de dois em dois anos na Herdade da Chaminé, a escassos quilómetros de Elvas. A última edição aconteceu entre os dias 10 e 15 deste mês, com direito a ‘after party’ no dia 16, sempre com o trance [estilo de música electrónica que se pauta por ritmos com mais de 150 batidas por minuto e que pode ser progressivo, psicadélico ou hard trance] em pano de fundo, alimentado pelo ‘Funktion 1’, considerado o mais potente sistema de som do Mundo para música electrónica. Brindados com dias de temperatura superior a 35 graus e muito pó, os festivaleiros do Freedom dividem os dias entre as pistas de dança, a zona chill out para descanso dos corpos, que não são de ferro, ou à beira da pequena albufeira que banha o recinto.
"As preocupações do dia-a-dia são esquecidas. Aqui somos autênticos e estamos todos juntos. É triste quando temos de ir embora. Muito triste", diz Inês Pombo, que além de ser uma fervorosa adepta deste género de eventos, este ano é uma das caras da ‘Tenda Rústica’, uma barraquinha de comida que faz do "aprumo dos temperos" das comidas vegetarianas o segredo do sucesso. "Desliga-se o relógio quando se entra aqui. É tão bonito", desabafa, com os olhos quase húmidos de emoção e envoltos na máscara de pintura facial, feita por uma amiga do festival.
"Há pessoas que só se encontram no Freedom de dois em dois anos, mas a união que se cria... Esta harmonia meio cósmica e psicadélica faz com que sejamos muito felizes aqui", descreve Inês, que esteve no festival elvense com um grande grupo, em que parte dos elementos tem "empregos de fato e gravata".
HIPPIES A NORTE
A mais de 500 quilómetros da cidade alentejana, na zona de Montalegre, as palavras partilhar, amar e respeitar são as mais repetidas pela comunidade Rainbow – um encontro de milhares de desconhecidos que, durante vários meses, convivem como se fossem uma grande família de irmãos e irmãs. Sem luz, água canalizada, telemóveis ou computadores. E boa parte deles sem roupa.
O ‘gathering’ realiza-se num país diferente todos os anos, escolhido por um grupo ao acaso, mas sempre com uma coisa em comum: a Natureza pouco tocada pelo homem é local de acampamento. Este ano, uma área protegida em Montalegre foi o sítio escolhido pela família portuguesa, que assume a estrutura do evento como uma "anarquia harmoniosa". É num terreno situado perto da aldeia de Salto que os hippies do século XXI se juntam por estes dias.
À noite, sob a luz da lua, costumam formar círculos onde se reza pela paz, pela espiritualidade e não por uma religião. Dentro do espaço ocupado pela comunidade não há circulação de dinheiro. Assim, cada um contribui com a comida que pode, muitas vezes comprada em povoados próximos, mas quem não oferecer nada também não passa fome. À hora do jantar, basta levar o ‘chapéu mágico’, que mais não é que um chapéu normal virado ao contrário, e esperar, na fila, que alguém o encha. Chega para todos. "Aqui ninguém passa fome", diz um dos participantes do Rainbow, que não se quis identificar.
O apelo à mega-reunião foi passando principalmente por e-mail, e todos os anos é eficaz. Chegam sempre participantes de todo o Mundo. O primeiro encontro foi em 1972, no Colorado, Estados Unidos da América, quando a cultura hippie despontava e prometia formas de vida alternativas.
ATÉ CAIR PARA O LADO
Dançar até não poder mais é a ordem não escrita que se segue em Elvas. No ‘main flor’ – a principal pista de dança do Freedom Festival – não importa que seja dia ou noite. Quase sempre um DJ está no palco para chamar a multidão, que em transe parece respirar o som. Na mancha humana – que este ano ficou aquém das expectativas pois eram esperadas dez mil pessoas e terão comparecido entre sete a oito mil – percebem-se os portugueses, sobretudo jovens. São ‘freaks’ ou ‘novos hippies’. Rastas, piercings e tatuagens são traços comuns no visual.
Entre os estrangeiros muitos são espanhóis, franceses e alemães. Dois japoneses vieram de propósito – mais de três mil euros, cada um, para chegar a Elvas. Gente com 40 ou 50 anos. Pais com filhos de colo. "Aqui não há um perfil tipo", diz Crystal Matrix, promotora que organiza o festival.
NUDEZ NATURAL
Os encontros Rainbow juntam economistas, médicos, padeiros, engenheiros, arquitectos e secretárias. Ali, são todos iguais e ninguém se conhece pela profissão que tem.
Poucos são aqueles que não se importam de ser fotografados. É que, para além das semanas que estes ‘irmãos’ e ‘irmãs’ passam em comunhão com a Natureza, há uma outra vida a retomar no final e todos acabam por se preocupar com a imagem social.
A nudez é encarada pelos participantes como natural. Muitos deles andam como vieram ao Mundo. Um dos participantes que se cobriu para falar com os jornalistas afasta a malícia do inusitado de uma confraternização desnuda – "não há toques de cariz sexual". Mas os limites só dependem do pudor de cada um: "Cada um faz o que quer. Se quiserem ter sexo, mesmo que seja à vista de todos, podem fazê-lo, mas nós não nos olhamos dessa forma carnal", afiança o nudista.
Os banhos são sempre tomados nos rios. A utilização de produtos químicos é proibida – "polui as águas", justifica um dos participantes. Mesmo assim, há quem não consiga passar sem um banho quente com sabonete e champô e por isso muitos dos participantes ficam alojados em pensões na civilização mais próxima. Mas há quem prefira nem tomar banho ou fazer depilação, palavra desconhecida para a maioria das mulheres.
LOJAS PARA TODOS
Mais de 30 lojas de artesanato, roupa, iluminação, jóias naturais, macramé, bijuteria, artigos sagrados, piercings, acessórios de pele feitos à mão, um supermercado e sete restaurantes compõem a ‘mobília’ dos 10 hectares da herdade alentejana ocupados por esta altura do ano, em cada calendário ímpar.
As estruturas-base são o já referido ‘main flor’ – a maior pista de dança inspirada nas pirâmides da cultura maia, o experience lodge, a zona de chill out, onde o som é mais tranquilo e onde há, entre outros, um local de massagens.
A healing area é uma das mais curiosas, pois a principal particularidade é a existência de uma espécie de farmácia natural, onde os pequenos percalços alimentares ou físicos, como entorses e pequenos cortes ou uma gastroenterite, se podem combater com uma infusão de plantas ou com uma pomada à base de ervas.
Cinema, galeria de arte e o palco alternativo, mais virado para a world music, são os outros recantos existentes na Herdade da Chaminé, em Elvas, local de sonho para muitos, do qual custa partir no fim da ‘viagem’.
"Quando termina o som é como se nos dessem uma facada, por isso é que há a ‘after party’. É uma espécie de desmame até ficarmos bem", descreve Marco. "A música tem que ir reduzindo aos poucos, depois vamos para o chill out, até tudo terminar de vez. Desligar as colunas e dizerem pura e simplesmente que acabou é o pior que podem fazer a quem gosta de trance", vaticina o festivaleiro. No campismo também se vive um ambiente sem tabus. "O pessoal aqui não tem problemas, nem em relação ao corpo nem em relação ao sexo, tudo é encarado com normalidade".
MESES EM FESTA
Desde que os primeiros chegam até que os últimos se vão embora podem passar dois, três, até seis meses. Já terão passado pelo Rainbow cerca de 2 mil pessoas O festival dura até ao fim de Agosto, mas cada um escolhe o seu ritmo. Os dias são de festa e repletos de actividades. De manhã há ioga, à tarde pode-se ler um livro na biblioteca comunitária ou aprender a fazer ginástica acrobática.
A cultura vegan impera: são proibidos todos os alimentos de origem animal. Assim, só entram legumes e hortaliças na cozinha comunitária, lugar com um fogão improvisado em pedra e um pequeno cano que desvia água do rio, onde se lava a louça. Sem detergente, claro. Um dos elementos da comunidade explica a opção vegetariana: "Além de respeitarmos os animais, era muito complicado cozinhar ovos para milhares de pessoas", diz.
EXCESSOS NARCÓTICOS
O acesso à Herdade da Chaminé para o Freedoom custava 110 euros por um passe de seis dias. O bilhete mais barato era 25 euros e dava só direito ao ‘after party’. Durante os dias do festival a GNR fez 95 detenções. Foram apreendidas cerca de sete mil doses individuais de droga. "Há droga em todos os festivais, em todas as ruas do Bairro Alto, em Lisboa, ou na avenida da Boavista, no Porto, como diz Gabriel o Pensador: ‘é mais fácil de encontrar que pão’", esclarece Inês Machado, engenheira do ambiente e membro da organização do Festival.
"Para dançar, há quem prefira o ecstasy e o MDMA, apesar de a maior parte do pessoal se ficar pela canábis. Os mais velhos gostam de LSD. Há alguma cocaína, cogumelos (alucinogénios) e pouca heroína. Não é difícil encontrar. Há sempre alguém que tem, que vende, que sabe, mas é difícil saber se é produto de confiança", explica Bruno (nome fictício), estudante em Portalegre que foi ao Freedom pela terceira vez. Na edição de 2009 faleceu uma jovem finlandesa e em 2007 uma israelita, ambas por overdose.
"Fazemos todos os possíveis para que nada aconteça de grave cá dentro. Proporcionamos as melhores condições possíveis, mas cada um deve ser responsável pelos seus actos", acrescenta Inês Machado, sublinhando que, para a "grande família", o que interessa é "o gosto pela música, pelo convívio, pela amizade e pelos laços fortes que se criam entre quem segue esta filosofia".
Sem a mesma intensidade de decibéis, os hippies do Rainbow partilham o mesmo espírito comunitário. Na internet diz-se que o próximo Rainbow acontece no México, em 2012, para celebrar a cultura maia no ano em que muitos acreditam que o calendário acaba. A próxima edição do Freedom ainda não está marcada, mas é provável que volte ao Alentejo em 2013.
ALTERNATIVOS NA AGENDA
Fazer uma ‘viagem’ em comunhão com a Natureza é a filosofia que alimenta os festivais alternativos. Em Portugal pontua o Boom Festival, evento bienal "de cultura independente" que surgiu em 1997, na Herdade do Zambujal, então dedicado à música electrónica. Com o tempo, "passou a ser reconhecido pelo programa ambiental e em 2010 venceu o prémio da UNEP para Festival Mais Ecológico do Ano", diz Artur Mendes da Good Mood.
A coincidir com a Lua Cheia de Agosto, o Boom cativa "o mercado internacional" e em 2010 recebeu, em Idanha-a-Nova, 20 mil pessoas de 70 países, graças à "promoção, na net e ‘boca-a-boca’, que atrai embaixadores de todo o Mundo".
Eventos diferentes reúnem mais adeptos e Nakshatra, Cosmic Walkers ou DancePlanet promovem festas tribais, trance e celebrações holísticas em locais ermos de Norte a Sul do País. "As festas, marcadas pela música electrónica e consumo de drogas, movimentam milhares de pessoas e a sua organização ronda os 10 mil euros", frisa o antropólogo Luís Vasconcelos.
NOTAS
SEGREDO
A localização exacta de cada encontro Rainbow só é divulgada em cima da hora. A discrição é uma regra.
A SOLTA
Nestes festivais convivem gentes de todas as profissões. Ali são todos iguais. Impera o espírito comunitário.
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