Sérgio Maggio
Publicação: 09/11/2010 08:00
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A polêmica bolinha de papel que voou na cabeça do candidato José Serra durante a campanha para presidente inspirou os sambistas Tantinho da Mangueira e Serginho Procópio. Numa mesa de partido de alto, a canção brotou cheia de malícia e graça. O assunto também virou piada de salão, ou melhor de Twitter, e inspirou humoristas profissionais e das horas vagas. É o humor nosso de cada dia, aquele que converte as mazelas do cotidiano em sonoras gargalhadas. O brasileiro ri de tudo, até dos fatos mais cabeludos. Das cuecas, meias e bolsas carregadas de dinheiro público às mazelas sentimentais, como as mais vis das traições. Somos reconhecido pelo jeito bem humorado de encarar a batalha do dia a dia.
— Nosso corpo é um meio de comunicação importante. A risada, o olhar e o movimento do brasileiro revelam muito sobre a nossa cultura. Mais do que a nossa fala ou escrita. A risada fala de um jeito de ser brasileiro de não levar as coisas muito a sério, de brincar até com os fatos considerados sérios, observa Mirian Goldenberg.
A antropóloga acaba de aplicar 200 questionários e realizar 50 entrevistas em profundidade com homens e mulheres moradores da cidade do Rio de Janeiro — o paraíso da comédia nacional. O objetivo: investigar a cultura da risada. Na pesquisa, ela percebeu que o riso como uma forma de liberdade, uma quebra de barreiras sociais, de incluir diferentes indivíduos. Todos afetados pela piada democrática. No trabalho de Mirian Goldenberg, o carioca funciona como microcosmo de uma nação que ri de si mesma.
— Em qualquer lugar do mundo, somos reconhecidos por esse diferencial: pelo nosso jeito de sorrir, pelo nosso gingado, por sermos mais abertos e extremamente fáceis de nos aproximarmos, até fisicamente. Diria que a nossa capacidade de sorrir, mesmo em momentos de dificuldade, de achar os lados positivos da vida, de procurar usufruir as pequenas alegrias nos faz ter essa diferença de outros povos, pontua Mirian.
Atualmente, ela pesquisa as mulheres alemãs. E já constatou: comparadas às brasileiras, elas pouco riem. Por aqui, a gargalhada emancipa quando vem de um mote crítico. Não à toa, tentaram censurar os humoristas durante as recentes eleições, impedindo que charges e caricaturas revelassem o lado patético da corrida ao poder.
— A piada tem sido uma forma importante de crítica e resistência política. Um bom exemplo foi o Pasquim, que, em plena ditadura militar, usou o humor para contestar o regime vigente. A entrevista da Leila Diniz, em 1969, foi tão importante que provocou a criação do Decreto Lei da Censura Prévia, apelidado por muitos de Decreto Leila Diniz. Com humor, é possível dizer coisas que não seriam ouvidas se fossem postas com extrema seriedade.
Qualidades do sorrir
Na tabulação de dados, que gerou diferenciações de gênero, Mirian vê qualidades do riso entre os pesquisados, que gostam tanto de um humor mais simples e cotidiano, como o de A grande família, como de um humor mais sofisticado, como o do CQC.
— O mais importante é que eles consigam se identificar com as situações colocadas. Por exemplo, os de classe média gostam dos seriados Friends e Two and a half men. Os mais pobres não se identificam e não acham graça naquelas situações típicas de classe média, observa.
O riso é mesmo espelho do brasileiro e está em alta na tevê, no teatro, no cinema. A pesquisadora detecta a enorme demanda pela risada. Verifica que 60% das mulheres que entrevistou querem rir mais. Elas adoram comédias e acham a risada algo fundamental para uma vida saudável e feliz.
— O corpo que ri vem desde a nossa origem como nação. Gilberto Freyre mostrou que uma forma dos ex-escravos se aproximarem dos senhores era por meio do sorriso, do toque, do uso do diminutivo. Toda a representação do Brasil como um paraíso tropical, com mais informalidade, uma sexualidade exuberante, corpos desnudos, reforça a ideia de que somos mais livres com os nossos corpos, conta.
Anotações de uma pesquisa
» 84% dos homens riem mais que as mulheres (68%)
» A maioria masculina acha que ri o suficiente. 60% dos homens dizem que não precisam rir mais.
» Já elas querem mais — 60% desejam sorrir mais
» São os homens que provocam mais o riso dos próprios homens e, também, das mulheres.
» Os amigos têm um papel fundamental. Os homens riem dos amigos e com os amigos, no trabalho, no bar, em situações diversas. Dizem que têm bom humor, que são bobos, descontraídos.
» Mulheres também riem mais com homens. As amigas aparecem muito depois dos amigos, namorados e maridos na relação de pessoas que as fazem rir.
» Os homens brincam mais e têm mais espaços para brincar (choppinho com os amigos, futebol, falar besteiras).
» Já as mulheres, muito mais do que eles, riem menos porque se preocupam com a autoimagem, com a postura profissional, com o que os outros vão achar e também por terem menos oportunidades para rir.
» As mulheres têm mais atividades sérias durante o dia, responsabilidades e cuidados com os outros e com elas próprias.
* Dados fornecidos por Mirian Goldenberg
— Nosso corpo é um meio de comunicação importante. A risada, o olhar e o movimento do brasileiro revelam muito sobre a nossa cultura. Mais do que a nossa fala ou escrita. A risada fala de um jeito de ser brasileiro de não levar as coisas muito a sério, de brincar até com os fatos considerados sérios, observa Mirian Goldenberg.
A antropóloga acaba de aplicar 200 questionários e realizar 50 entrevistas em profundidade com homens e mulheres moradores da cidade do Rio de Janeiro — o paraíso da comédia nacional. O objetivo: investigar a cultura da risada. Na pesquisa, ela percebeu que o riso como uma forma de liberdade, uma quebra de barreiras sociais, de incluir diferentes indivíduos. Todos afetados pela piada democrática. No trabalho de Mirian Goldenberg, o carioca funciona como microcosmo de uma nação que ri de si mesma.
— Em qualquer lugar do mundo, somos reconhecidos por esse diferencial: pelo nosso jeito de sorrir, pelo nosso gingado, por sermos mais abertos e extremamente fáceis de nos aproximarmos, até fisicamente. Diria que a nossa capacidade de sorrir, mesmo em momentos de dificuldade, de achar os lados positivos da vida, de procurar usufruir as pequenas alegrias nos faz ter essa diferença de outros povos, pontua Mirian.
Atualmente, ela pesquisa as mulheres alemãs. E já constatou: comparadas às brasileiras, elas pouco riem. Por aqui, a gargalhada emancipa quando vem de um mote crítico. Não à toa, tentaram censurar os humoristas durante as recentes eleições, impedindo que charges e caricaturas revelassem o lado patético da corrida ao poder.
— A piada tem sido uma forma importante de crítica e resistência política. Um bom exemplo foi o Pasquim, que, em plena ditadura militar, usou o humor para contestar o regime vigente. A entrevista da Leila Diniz, em 1969, foi tão importante que provocou a criação do Decreto Lei da Censura Prévia, apelidado por muitos de Decreto Leila Diniz. Com humor, é possível dizer coisas que não seriam ouvidas se fossem postas com extrema seriedade.
Qualidades do sorrir
Na tabulação de dados, que gerou diferenciações de gênero, Mirian vê qualidades do riso entre os pesquisados, que gostam tanto de um humor mais simples e cotidiano, como o de A grande família, como de um humor mais sofisticado, como o do CQC.
— O mais importante é que eles consigam se identificar com as situações colocadas. Por exemplo, os de classe média gostam dos seriados Friends e Two and a half men. Os mais pobres não se identificam e não acham graça naquelas situações típicas de classe média, observa.
O riso é mesmo espelho do brasileiro e está em alta na tevê, no teatro, no cinema. A pesquisadora detecta a enorme demanda pela risada. Verifica que 60% das mulheres que entrevistou querem rir mais. Elas adoram comédias e acham a risada algo fundamental para uma vida saudável e feliz.
— O corpo que ri vem desde a nossa origem como nação. Gilberto Freyre mostrou que uma forma dos ex-escravos se aproximarem dos senhores era por meio do sorriso, do toque, do uso do diminutivo. Toda a representação do Brasil como um paraíso tropical, com mais informalidade, uma sexualidade exuberante, corpos desnudos, reforça a ideia de que somos mais livres com os nossos corpos, conta.
Anotações de uma pesquisa
» 84% dos homens riem mais que as mulheres (68%)
» A maioria masculina acha que ri o suficiente. 60% dos homens dizem que não precisam rir mais.
» Já elas querem mais — 60% desejam sorrir mais
» São os homens que provocam mais o riso dos próprios homens e, também, das mulheres.
» Os amigos têm um papel fundamental. Os homens riem dos amigos e com os amigos, no trabalho, no bar, em situações diversas. Dizem que têm bom humor, que são bobos, descontraídos.
» Mulheres também riem mais com homens. As amigas aparecem muito depois dos amigos, namorados e maridos na relação de pessoas que as fazem rir.
» Os homens brincam mais e têm mais espaços para brincar (choppinho com os amigos, futebol, falar besteiras).
» Já as mulheres, muito mais do que eles, riem menos porque se preocupam com a autoimagem, com a postura profissional, com o que os outros vão achar e também por terem menos oportunidades para rir.
» As mulheres têm mais atividades sérias durante o dia, responsabilidades e cuidados com os outros e com elas próprias.
* Dados fornecidos por Mirian Goldenberg
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.http://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia182/2010/11/09/diversaoearte,i=222306/PESQUISA+MOSTRA+QUE+O+HUMOR+E+TRACO+DA+FORMACAO+CULTURAL+BRASILEIRA.shtml
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