Discurso de Lula da Silva (excerto)

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sábado, 24 de maio de 2008

LIVROS PARA METER AO BOLSO

03/08/2001 | Livros

Texto: João Carlos Barradas.

O moderno livro de bolso é uma invenção da era victoriana. Surgiu para responder à procura das classes letradas em viagem " a par do boom dos caminhos de ferro, da linhas oceânicas e do nascimento do turismo " e de um novo público leitor, produto da escolarização crescente. O Reino Unido, os Estados Unidos e a Alemanha foram, então, os principais centros de difusão deste novo segmento da indústria livreira.
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As edições de bolso alemãs de clássicos da Tauchnitz, a partir de 1841, e da Reclam, desde 1858, ambas de Leipzig, definiram as normas do sector até 1935, quando o editor Allen Lane, da "The Bodley Head", de Londres, apostou no lançamento de uma colecção revolucionária.
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A 30 de Julho de 1935 foram postos à venda os primeiros dez Penguins. Por seis pences, o preço de um maço de tabaco, a colecção da "The Bodley Head" (a Penguin só se autonomizou em Janeiro de 1936 com um capital de 100 libras) colocava à venda, no maior número possível de locais, autores contemporâneos como Ernest Hemingway, Agatha Christie, Dorothy L. Sayers ou André Maurois.
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As colecções distinguiam-se pela cor das capas: verde para policiais, azul-escuro para biografias e cor-de-laranja para ficção. Em 1937 tinham já sido vendidos três milhões de Penguins e estava consumada a revolução do paperback.
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No início da década de 50, o livro de bolso era um dos sectores mais lucrativos da indústria livreira nos mercados de língua inglesa, alemã, francesa, italiana, espanhola, árabe, chinesa e japonesa. Uma característica essencial era a colocação dos títulos no maior e mais diversificado possível número de postos de venda. As altas tiragens, frequentemente superiores a 30 mil exemplares, possibilitaram o abaixamento do preço de venda e a criação de hábitos correntes de compra de livros.
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O recurso comercial mais frequente passava pela reimpressão de títulos de sucesso no segmento de capa dura, através de contratos de partilha dos lucros entre editores, e o lançamento de clássicos caídos no domínio público. Gradualmente, as colecções começaram a incorporar também originais. Para além da explosão de colecções de índole recreativa e prática, o sector da edição pedagógica aproveitou a procura de livros escolares e académicos para lançar colecções de bolso destinadas ao público estudantil.
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A partir dos anos 50, as editoras universitárias norte-americanos, rapidamente imitadas em praticamente todo mundo, empreenderam o lançamento sistemático de edições paperback, sensivelmente mais caras do que o livro de bolso corrente, mas vendidas a pouco mais de metade do preço da edição hardcover.

Em Portugal " ao contrário de Espanha, onde a Espasa-Calpe massificou o livro de bolso a partir de 1937, com a magnífica e diversificada colecção Austral " este segmento só ganhou presença significativa a partir do final dos anos 40. A iniciativa partiu da editora Livros do Brasil, com as colecções "Miniatura" (ficção não-portuguesa, já extinta) e as clássicas e ininterruptas "Vampiro" (policial, desde 1947) e "Argonauta" (ficção científica, lançada em 1953).
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Nas colecções de bolso dos Livros do Brasil destacaram-se as capas de pintores como Bernardo Marques (1899 - 1962) para a "Colecção Miniatura" ou Lima de Freitas (1927 - 1998) para a "Vampiro". Os volumes esgotados, em colecções que no conjunto ultrapassaram um milhar de títulos, podem ultrapassar os 3.000$00 nos alfarrabistas.
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A Europa-América foi outra editora que, desde 1971, com o lançamento de "Esteiros", de Soeiro Pereira Gomes, se decidiu a inaugurar os seus livros de bolso. Apostou de forma continuada na edição paperback de autores contemporâneos nacionais e estrangeiros " no seguimento da colecção do final da década de 50, com "Os livros das três abelhas", concebida por Lyon de Castro ", além das séries de carácter científico e pedagógico que iniciou nos anos 50 com a colecção "Saber".
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O livro de bolso em Portugal acabou por ter uma penetração mais fraca do que na maior parte dos países da Europa Ocidental devido à escassez e fraco poder de compra de leitores potenciais, deficiente distribuição, baixa qualidade frequente das traduções, da impressão, do papel" em suma, livros a desfazerem-se nas mãos.
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De certo modo, a situação portuguesa " apesar do êxito esporádico de iniciativas como os livros "Unibolso", dos Editores Associados, ou as colectâneas de análise política "Cadernos Dom Quixote", nos anos 60 " tem semelhanças com o Brasil, onde a introdução do livro de bolso pela Ediouro, nos anos 40, foi prejudicada pela fixação dos leitores em edições formato tradicional, de capa dura e de luxo.
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Apesar do empenho de editoras como a Brasiliense na publicação de textos de divulgação científica, técnica e de ensaio, só desde o final dos anos 90 o formato de bolso ganhou novo fôlego graças ao investimento continuado da Ediouro e ao surgimento de novas colecções de editoras como a L&PM e a Paz e Terra, apostando mesmo no lançamento de inéditos " alguns premiados, como o "Dançar Tango em Porto Alegre", de Sérgio Franco, Prémio de Melhor Ficção 1999, da Academia Brasileira de Letras.
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Em Portugal, apesar da proliferação de edições no formato de bolso, muitas editoras ou encareceram excessivamente o produto, sem aumento da qualidade da oferta (caso dos policiais e ficção científica da Editorial Caminho, por exemplo, apesar da excelência da selecção dos títulos), ou descuidaram as traduções (deficiência desastrosa no caso da Europa-América), ou suspenderam colecções para só as retomarem agora, como sucede com a "Biblioteca de bolso Dom Quixote", relançada em Julho deste ano em parceria de edição e distribuição com a FNAC.
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A possibilidade de lançamento de edições em formato de bolso, aproveitando eventos ou a celebração de efemérides de grande repercussão é, em regra, desaproveitada. A Comissão Nacional para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses não apostou na divulgação no formato de bolso, a Porto 2001 seguiu pelo mesmo caminho, as universidades ignoram este segmento de mercado e a maior parte das fundações despreza o apoio ou investimento na área (há excepções, como é o caso da Fundação Mário Soares, em associação com a Gradiva).
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A "Colecção 98 Mares", editada pela Expo"98, revelou-se, recentemente, um exemplo de aproveitamento pontual de um acontecimento de grande impacto para promover uma colecção ecléctica. Com "os oceanos" como tema genérico comum, conseguiu vender mais de 500 mil exemplares dos seus 98 títulos.
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Mesmo sem bolso disponível, livros como estes são um hábito que se leva para todo o lado, quase um objecto fetiche de uma temporada de viagens. O NetParque sugere uma pequena selecção, diversificada q.b., que começa no policial e termina no romance, passando pela poesia, pela ficção científica ou pelos contos do maravilhoso. Só tem que os procurar e meter ao bolso " depois de passar pela caixa registadora, evidentemente.
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Para tomar nota:

"O Imenso Adeus", Raymond Chandler, Livros do Brasil, 780$00

Só os heróis sofridos de Chandler se despedem assim: "Você comprou uma grande parte de mim, Terry. E só com um sorriso e um acenar de mão e algumas bebidas que bebemos em sossego por aqui e por ali. Até à vista, amigo. Não lhe direi adeus. Disse-lhe quando tinha algum significado. Quando era triste, desolado e final."
Com este clássico leva da melhor literatura passada a português de forma superior por Mário Henrique Leiria.

"A Queda dum Anjo", Camilo Castelo Branco, Ulisseia, 730$00

Se falhar as novidades da rentrée política uma certeza pode guardar: a corrupção dos novíssimos émulos de Calisto Elói de Silos e Benevides de Barbuda é eterna.
Neste Verão será assolado como sempre pelos folhetins de quem jure "pôr a pontaria aos vícios", mas depois de ler Camilo, tão certeiro nos dias de hoje quanto em 1865, perceberá melhor como é que os anjos caídos lá se vão "concertando menos mal com a sua vida".

"Cantares dos Trovadores Galego-Portugueses", Antologia de Natália Correia, Editorial Estampa, 2.300$00

O lirismo de certas cantigas d`amigo, como a famosa alba de Nuno Fernandes Torneol, é, necessariamente, uma das melhores razões que Natália Correia antologiou para não desesperar da "Mátria" portuguesa.

"Doutor Fausto", Christopher Marlowe, Editorial Inquérito, 1.000$00

"Um mágico sagaz é quase um deus. Aguça o teu engenho, Fausto, e sê divino!"
Leia a obra-prima de Christopher Marlowe, um dos grandes génios da Renascença em Inglaterra, vá até à origem da ideia moderna do Homem dado à paixão e ao individualismo, descubra "o máximo que a magia pode obrar." Leva uma excelente edição bilingue e quando acabar nunca mais vê este mundo com os mesmos olhos.

"Antes que anoiteça", Reinaldo Arenas, Asa, 1.950$00

Particularmente recomendado para quem seguir para Cuba (e o rum e as praias e a decadência e o esplendor colonial e os dólares e a santería e o bolero e a conga e Fidel) e, mesmo assim, queira compreender porque é que um dos poetas maiores da ilha, Reinaldo Arenas, escrevia que "a única coisa que nunca nos abandona é a insatisfação."
Sem sombra de autocomiseração, mordaz, tem aqui as palavras da vida dum dissidente, homossexual, exilado, para quem uma ditadura era inevitavelmente "anti-estética e grotesca".

"O Congresso Futurológico", Stanislaw Lem, Editorial Caminho, 1.100$00

Que não lhe aconteça o mesmo que ao desditado herói de Lem, que não chegue à Costa Rica " de férias ou mesmo como conferencista num congresso de futurólogos " para dar com tumultos nas ruas, saraivadas de bombas de gás tranquilizante, que não se veja obrigado a fugir para os esgotos...
Que nada disso lhe aconteça para poder apreciar uma das obras maiores deste mestre polaco, um dos autores incontornáveis da ficção científica.

"Contos Orientais", Marguerite Yourcenar, D.Quixote-FNAC, 880$00

Um mestre perde-se na sua pintura e neste conto maravilhoso tem já um fio da meada sumptuosa que é a escrita da grande senhora das letras francesas. Tudo o que Marguerite Yourcenar escreveu envolve de tal maneira o leitor que é pecado descurar a precisão dos verbos, ignorar a sumptuosidade dos adjectivos, embora se deva dizer que estes contos têm uma leveza muito especial. Parece tão simples escrever assim, mas só está mesmo ao alcance de quem sabe esculpir as palavras e o tempo.

"Coração, Solitário Caçador", Carson McCullers, Ed. Europa-América, 1.100$00

Singer, um surdo-mudo, num quarto alugado numa cidade do Sul dos Estados Unidos, um adolescente e mais gente, todos com os seus problemas, a todos Singer poderá ajudar. O romance de estreia, em 1940, de Carson McCullers, em tradução superior de José Rodrigues Miguéis. Uma daquelas histórias que levam a acreditar na bondade. Procure, também, o filme que Robert Ellis Miller realizou em 1968. Se chora a ver cinema com "The Heart is a Lonely Hunter" vai desfazer-se em lágrimas e, no final, suspirar de felicidade.

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netparque.pt/NPShowStory



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