27.10.2012 - 11:57 Por Elias Groll, Alicia P.Q. Wittmeyer
Os municípios latino-americanos somam 40 das 50 capitais mundiais do crime, e só quando chegamos ao número 21 é que uma cidade fora da América Latina surge na lista.
Viver na América Latina, ao que parece, pode ser mau para a saúde. Uma combinação de drogas, crime organizado e governos que estão, às vezes, mal equipados para enfrentar os desafios mostrou ser letal, deixando um rasto de violência um pouco por toda a América Latina. Do Brasil às Honduras, passando pelo México, concluiu o think tank mexicano Conselho de Cidadãos para a Segurança Pública e a Justiça Criminal.
Segundo o seu ranking, as dez cidades com as taxas mais altas de homicídios do mundo situam-se todas na América Latina. O estudo só inclui cidades onde existem estatísticas de homicídios, o que significa que cidades que enfrentam sangrentas guerras civis para as quais é impossível recolher estatísticas fiáveis - como Alepo, na Síria, por exemplo - não foram incluídas na lista.
Segue-se um olhar sobre a violência que se tornou rotina na vida destas cidades, tendo sido incluídas algumas fora da América Latina que entraram no top 50 para se perceber como os factores por trás da violência diferem em alguns casos - e noutros permanecem infelizmente os mesmos.
1. San Pedro Sula, Honduras
Quando a Colômbia atacou o infame narcotráfico no final dos anos 1980, o negócio da droga mudou-se para norte, para o México. Mas desde que o Presidente mexicano, Felipe Calderón, declarou guerra aos cartéis da droga em 2006, a paragem seguinte para os traficantes foi as Honduras. Quase 80% da cocaína que viaja da América do Sul para a América do Norte agora pára nas Honduras, trazendo com ela uma vaga de violência relacionada com os gangs e as drogas. A taxa de homicídios das Honduras é actualmente a mais alta do mundo e a taxa de homicídios de San Pedro Sula é a maior das Honduras, com 159 assassinatos por cem mil habitantes em 2011. Por comparação, a taxa de homicídio de Detroit é de 48 por cem mil habitantes. Localizada no Noroeste das Honduras, San Pedro Sula é o principal centro industrial e a segunda maior cidade do país. Mas, ultimamente, o papel económico da cidade foi largamente ensombrado pela violência.
2. Ciudad Juárez, México
Esta cidade fronteiriça - é um ponto de partida da droga que entra nos Estados Unidos - tem estado sempre no topo das tabelas das cidades mais perigosas do mundo. Juárez ganhou a sua sinistra reputação em resultado da guerra entre os cartéis de droga de Juárez e de Sinaloa, que matou seis mil pessoas entre 2008 e 2010. Os cartéis e a corrupção entre a polícia e o governo local transformaram Juárez numa cidade-fantasma. Este ano tem havido sinais de que a violência está a diminuir: durante o seu auge, a guerra dos cartéis chegou a produzir 300 corpos por mês, mas nos primeiros sete meses deste ano o número de homicídios foi de 580, segundo o jornal The Washington Post. Os observadores atribuem este declínio ao triunfo do cartel de Sinaloa sobre o de Juárez na guerra pelo controlo da cidade. Ainda assim, com uma taxa de 148 homicídios por cem mil habitantes, Juárez assegura o segundo lugar desta lista.
3 Maceió, Brasil
As autoridades brasileiras querem transformar este antigo porto e produtor de açúcar num destino turístico, apostando na sua linha costeira de areias macias. O esforço, porém, tem sido destruído por uma taxa de 135 homicídios por cem mil habitantes. As autoridades de Maceió - a capital do nordestino estado de Alagoas - dizem que o aumento da violência (a taxa de assassínios subiu 180% em dez anos) se deve à crescente presença de crack e cocaína nas favelas à volta da cidade. Talvez para assegurarem que o dinheiro dos turistas continua a entrar, as autoridades também dizem que a maior parte das vítimas são toxicodependentes que são mortos por não pagarem as suas dívidas.
4. Acapulco, México
Conhecida em tempos pelas suas praias, hotéis de luxo e clubes nocturnos que atraíam clientes como Frank Sinatra e Elizabeth Taylor, Acapulco não escapou à violência relacionada com o tráfico de droga que abocanhou todo o México e é hoje a segunda cidade mais violenta do país. Tem 128 homicídios por cem mil habitantes. A luta pelo domínio do estado de Guerrero levou a que houvesse tiroteios na zona que, outrora, foi a principal área de resorts de Acapulco. E em vários dos lugares mais selectos da cidade foram encontradas cabeças decepadas. Inevitavelmente, o turismo foi afectado: o dirigente da associação de agências de viagens de Guerrero estima que em Novembro de 2010 o turismo proveniente do Canadá e EUA caiu entre 40% e 50%. 5. Distrito Central, HondurasÉ constituído pela capital, Tegucigalpa, e pela cidade vizinha de Comayaguela, e foi engolido pela mesma dinâmica da violência - droga, gangs, desigualdade - de San Pedro Sula, a norte do país. A morte é de tal forma um lugar-comum que, este ano, o presidente da câmara começou a oferecer enterros aos pobres; cansou-se de ver tantos corpos dentro de sacos de lixo. Os gangs, a corrupção e a pobreza estão há muito presentes nas Honduras, mas o que fez escalar a violência para níveis nunca vistos foi o novo papel das Honduras - é uma das principais artérias no contrabando de drogas entre o Sul e o Norte. Um golpe de Estado em 2009 gerou o caos político e deu força aos traficantes. No mesmo ano, o responsável pela guerra ao narcotráfico foi morto dentro do seu carro em Tegucigalpa. O Distrito Central tem uma taxa de cem homicídios por cem mil habitantes.
6. Caracas, Venezuela
Os chamados "malandros" - gangs de jovens que, como galos ao poleiro, guerreiam entre si pelo controlo da venda de drogas e das apostas - transformaram a capital da Venezuela num palco de guerra. Em 2011, Caracas assistiu a 3164 homicídios - um número vertiginoso que fica ligeiramente aquém do número de fatalidades sofridas pela coligação que esteve no Afeganistão durante os dez anos de conflito naquele país. As autoridades venezuelanas têm sido acusadas de falsificar o número de homicídios, e o número actual é bastante superior ao que está nas estatísticas oficiais. Para piorar a situação, mais de 90% dos crimes de morte da Venezuela ficam por solucionar. Não admira, pois, que a escalada na violência tenha sido o tema principal da campanha de Henrique Capriles, que concorreu contra Hugo Chávez nas eleições presidenciais e acusou este de não conseguir parar o derramamento de sangue. (Chávez foi reeleito; desde que chegou ao poder, em 1998, a taxa de homicídios duplicou.) Os especialistas dizem que a combinação do fácil acesso a armas, da cultura de violência entre os jovens e da falta de acção policial e judicial criou uma tempestade perfeita e deixou a Venezuela com uma taxa de 99 homicídios por cem mil habitantes.
7. Torreón, México
Vítima da guerra do narcotráfico, a cidade de Torreón é palco de lutas de morte constantes, à medida que os barões da droga guerreiam pelo controlo de uma lucrativa rota de escoamento de produto na fronteira norte do México. No ano passado, a cidade teve 88 homicídios por cem mil habitantes. Num só domingo de Julho, dez pessoas foram mortas na cidade. A guerra tem-se vindo a intensificar e tornou-se cada vez mais difícil para o cidadão comum escapar dela.
8. Chihuahua, México
Situada na fronteira do México com o Texas, é uma zona-chave no transporte da cocaína para os Estados Unidos da América. Por isso, é um campo de batalha dos cartéis interessados em controlar as rotas da droga. A violência em Chihuahua tornou-se imparável, chegando a 83 homicídios por cem mil habitantes. No dia 15 de Abril, por exemplo, dez homens com fardas de combate entraram num bar e abriram fogo, matando 15 pessoas, entre elas dois jornalistas, Francisco Javier Moya, antigo director de informação da estação de rádio da Ciudad Juárez, e Hector Javier Salinas Aguirre, proprietário de um site de notícias. Quase 50 jornalistas foram mortos no México desde que o Presidente [em fim de mandato] Felipe Calderón chegou ao poder, em 2006. Os cartéis aumentaram os ataques contra jornalistas que ousaram noticiar a guerra da droga.
9. Durango, México
Em 2011, a violência da guerra do narcotráfico no México atingiu a sua máxima expressão com a descoberta de uma série de valas comuns (fossas, chamam-lhe os mexicanos) no Norte da cidade de Durango. As autoridades descobriram uma delas nas traseiras de uma casa de luxo e outra no parque de estacionamento de um pequeno supermercado abandonado. No total, continham 340 corpos e os habitantes da cidade tiveram de se submeter a testes de ADN para saberem se os seus familiares desaparecidos estavam entre os mortos. Mas descobrir os crimes é uma coisa, outra muito diferente é punir os responsáveis. "Qualquer pessoa que saiba o que se passou nunca falará, por medo", disse a um jornalista o porta-voz do promotor público estadual. Pressionado a dizer de quem é a casa de luxo, perguntou ao jornalista: "Quer que eu ainda esteja vivo amanhã?" Em 2011, Durango tinha uma taxa de homicídios de 80 mortes por cem mil habitantes.
10. Belém, Brasil
Com a cocaína a chegar da Bolívia, da Colômbia e do Peru, Belém tornou-se um posto de trânsito natural para os traficantes sul-americanos. A droga entra na cidade através da densa floresta amazónica. Viaja primeiro de avião, depois de barco e, finalmente, é distribuída para outras cidades brasileiras, europeias e norte-africanas. O que torna Belém - onde a taxa de homicídio é de 78 mortos por cem mil habitantes - uma naco de terra muito atractivo, com a violência a aumentar na mesma proporção da importância da cidade para o narcotráfico, à medida que o Brasil enriquece, os seus habitantes consomem mais cocaína. O Financial Times chamou ao aumento de consumo de cocaína no Brasil - ali se consome 18% do produto disponível em todo o mundo - o "dano colateral mais preocupante do boom de consumo" neste país.
21. Nova Orleães, EUA
Esta cidade fez um esforço colossal para se reconstruir depois da devastação provocada pelo furacão Katrina, em 2005. Mas a taxa de homicídios - 50 por cem mil habitantes - teima em manter-se a mais alta dos EUA. A cidade sofre da mesma pobreza e do fácil acesso a armas que outras capitais de assassínios, mas não é conhecida por ter os gangs organizados que existem nas outras. Um relatório do governo de 2011 concluiu que os assassínios em Nova Orleães se devem a disputas pessoais que ficam incontroláveis. "Fins extraordinários para conflitos banais", disse o superintendente da polícia local, Ronal Serpas. O governo local tentou travar esta matança enviando agentes com a missão de arrefecer o ambiente nas ruas depois de tiroteios, evitando retaliações. Porém, no que toca a homicídios, a cidade continua a destacar-se de todas as outras dos EUA.
33. Kingston, Jamaica
Kingston tem a mais elevada taxa de homicídios das Caraíbas. A cidade é, há décadas, refém dos gangs - sobretudo os bairros de West Kingston e Grants Pen. Mas as atenções voltaram-se novamente para a violência quando o governo local decidiu adoptar uma política de confronto aos gangs. A caça ao homem feita contra um dos mais conhecidos criminosos, Christopher Coke, foi notícia em todo o mundo em 2010, tendo deixado 70 pessoas mortas nos Tivoli Gardens, onde Coke estabelecera a sua praça forte. As autoridades dizem que a nova abordagem está a resultar e que se deve a ela a descida do crime em 60%. Outros consideram que o resultado da iniciativa foi o aumento do número de mortes. Os EUA continuam a advertir os viajantes com destino à Jamaica, sublinhando que, "apesar de a maior parte dos crimes ocorrer em zonas pobres, os actos de violência como tiroteios podem ocorrer em qualquer parte". Por cada cem mil habitantes, há 47 homicídios em Kingston.
44. Mosul, IraqueMosul - a cidade com a taxa de homicídios mais alta do Médio Oriente, 35 por cem mil habitantes - é a morada de uma volátil luta sectária entre curdos e sunitas. Tendo sido um dos últimos bastiões urbanos da Al-Qaeda, Mosul, que integra uma vasta região rica em petróleo, tem sido palco de constantes ataques terroristas e é uma das cidades de mais difícil acesso do Iraque desde a retirada dos EUA em 2011. Militantes continuam a realizar ataques contra o governo xiita da cidade. As divisões obrigam as forças de segurança a lutarem, volta e meia, para controlarem a cidade - em Abril de 2011 cinco soldados iraquianos e três outras pessoas morreram num ataque suicida. No mesmo ano, a taxa de homicídios foi de 35 por cem mil habitantes.
Exclusivo PÚBLICO/Foreign Policy
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