Discurso de Lula da Silva (excerto)

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sábado, 31 de março de 2012

Os segredos do arquivo do Vaticano estão a ser revelados a todos


Registo de juramento de fidelidade do cardeal Gil de Albornoz ao Papa Incêncio VI
Registo de juramento de fidelidade do cardeal Gil de Albornoz ao Papa Incêncio VI (Fotos: DR)
Registo de juramento de fidelidade do cardeal Gil de Albornoz ao Papa Incêncio VI
Julgamento dos Templários em França: 60 metros de pergaminho
Registo de juramento de fidelidade do cardeal Gil de Albornoz ao Papa Incêncio VI
Assinatura de Galileu Galilei, no documento em que este aceita a sentença que contra ele pronunciara o Santo Ofício, em 1633
Registo de juramento de fidelidade do cardeal Gil de Albornoz ao Papa Incêncio VI
Um “privilégio” concedido por Otão I, pergaminho púrpura em letras de ouro
Registo de juramento de fidelidade do cardeal Gil de Albornoz ao Papa Incêncio VI
Carta dos cardeais ao futuro Papa Celestino V
Registo de juramento de fidelidade do cardeal Gil de Albornoz ao Papa Incêncio VI
Um dos corredores do Arquivo do Vaticano

Cultura

31.03.2012 - 13:56 Por António Marujo, em Roma


 Exposição mostra uma centena de documentos que fizeram a história da Europa e do mundo e que pela primeira vez saem do arquivo dos papas, que acaba de fazer 400 anos. Galileu está lá.

O mais impressionante será, talvez, o rolo com o processo dos Templários. Sessenta metros de pergaminho que incluem 231 confissões de outros tantos cavaleiros do Templo, redigidos entre 17 e 20 de Agosto de 1308, perante os três cardeais enviados pelo Papa Clemente V ao castelo de Chinon, em França. Nos depoimentos pode ler-se o confronto entre o medo dos cavaleiros templários em se contradizerem e o frustrado desejo de defender a sua ordem. A contradição significava a morte.

O mais comovente será, talvez, a assinatura de Galileu Galilei. O volume de pergaminho mostra a página em que o cientista aceita a sentença que contra ele pronunciara o cardeal Roberto Bellarmino, presidente do Tribunal do Santo Ofício. Narra a história que Galileu tomou uma vela na sua mão esquerda enquanto colocava a direita sobre a Bíblia, ajoelhando-se e abjurando as suas afirmações científicas. Foi em 22 de Junho de 1633, no convento de Santa Maria Sopra Minerva, em Roma.

Colocado numa espécie de passadeira rolante, o rolo com o processo dos Templários é um dos 100 documentos da História da Europa e do mundo que se podem ver na exposição Lux in arcana - L"Archivio Segreto Vaticano si rivela (Luz sobre os enigmas - o Arquivo Secreto Vaticano revela-se). Uma exposição inédita, aberta pela sentença de Galileu, patente nos Museus Capitolinos, de Roma (Itália), até 9 de Setembro. É um acontecimento histórico porque, pela primeira vez, estes documentos saíram do arquivo papal e podem ser agora contemplados por todos. 

Mostra-se aqui apenas uma milionésima parte do Arquivo Secreto, criado formalmente há 400 anos pelo Papa Paulo V e que reúne documentação dos séculos VIII ao XX. Secreto vem do latim secretum e quer dizer privado. Ao longo dos séculos, os papas foram guardando documentos e correspondência relativos ao exercício do seu ministério. 

Hoje há mais de 650 fundos de arquivos diferentes, arrumados em 85 quilómetros de estantes, a maior parte delas colocadas em instalações de acesso reservado, no subsolo do Cortile della Pigna, onde todos os dias passam milhares de visitantes dos Museus do Vaticano. São milhões de documentos, dos quais 30 mil pergaminhos, que desde 1881 estão disponíveis à consulta de investigadores, sem distinção de nacionalidade ou religião. 

O último núcleo da exposição, o do "período fechado", mostra mesmo documentos duplamente inéditos, já que se referem ao pontificado de Pio XII. Os arquivos do Papa Pacelli estão ainda a ser tratados e deverão ser abertos dentro de dois anos. Bento XVI tem vontade de apressar essa abertura, já que o comportamento de Pio XII durante a Segunda Guerra Mundial tem sido objecto de debate e polémica. Os documentos expostos referem-se a episódios e memórias fotográficas de vítimas do conflito.

Na exposição, podem ver-se também 85 selos de deputados a favor dos amores de Henrique VIII (1530). Ou uma carta de Lucrécia Bórgia ao seu pai, o Papa Alexandre VI, avisando-o contra a chegada do exército francês a Roma, em 10 de Junho de 1494. Ou ainda a caligrafia delicada de um califa, também a 10 de Junho, mas de 1250 (648 no calendário muçulmano), e uma carta da última imperatriz da dinastia Ming, escrita num pedaço de seda em 1650, no "11.º dia da 10.ª lua do quarto ano do reino do imperador Yongli". E pode ver-se também o mais antigo documento em língua mongol (1279) ou uma bula do Papa Clemente VIII em língua quechua (1603).

Poetas e rainhas

A exposição organiza-se em dez núcleos: no primeiro, Os guardiães da memória, mostram-se documentos fundamentais ou curiosidades da história da Igreja Católica ou da humanidade. Cabem aqui o processo de Galileu, mas também o cancioneiro do poeta persa Muhtašam-i Kašani (1582), a aprovação da regra de São Francisco de Assis (1223) ou a entrega de uma condecoração honorífica a Mozart (1770). 

Nas secções Tiara e coroa e Sinais de poder, expõem-se documentação relativa aos conflitos ou aproximações entre o poder dos papas e dos reis ou imperadores, como a Concordata entre a Santa Sé e Napoleão (responsável por ter levado o Arquivo do Vaticano para Paris, entre 1810 e 1815, o que fez com que se perdessem documentos preciosos) ou o nascimento do Estado do Vaticano (1929). O ouro e a tinta e Nos segredos dos conclaves revelam episódios de eleições ou deposições de papas (como a de Urbano VI, em 1378, dando origem ao Cisma do Ocidente, ou do único Papa que renunciou ao cargo, Celestino V, em 1294). A reflexão e o diálogo inclui uma carta do Papa Clemente XII ao vice do Dalai Lama, em 1732, bem como a convocatória de João XXIII para o Concílio Vaticano II, em 1961, que se traduziu na actualização da Igreja Católica. E sobram ainda retratos de pessoas: heréticos, cruzados e cavaleiros, santas, rainhas e cortesãs, e cientistas, filósofos e inventores. Aqui se incluem apelos desesperados como o de Maria Antonieta de França ou de Nicolau Copérnico, as condenações de Giordano Bruno ou Martinho Lutero, o horror do Papa Inocêncio III com os relatos das cruzadas e uma carta do anticlerical Voltaire ao "pai do mundo", o Papa Bento XIV. 

A mostra Lux in Arcana inclui ainda, no final, alguns fragmentos de documentos, através dos quais se pode perceber o que acontece quando os insectos, a humidade ou a luz, entre outros factores, destroem preciosidades de arquivos. 

Uma vertente multimédia está disponível no site oficial da exposição (www.luxinarcana.org), onde se podem ver alguns dos documentos mais significativos. Também é possível descarregar gratuitamente uma aplicação para Android e iOS que permite fazer uma visita guiada. 

Na carta Humanae Salutis, com que convocou todos os bispos católicos para o Concílio Vaticano II, em 1961, o Papa João XXIII escrevia: "Se o mundo aparece profundamente mudado, também a comunidade cristã está em grande parte transformada e renovada: isto é, socialmente fortalecida na unidade, intelectualmente revigorada, interiormente purificada, pronta, desta forma, a enfrentar todos os combates da fé." Muitas transformações e muitos combates se contam nestes documentos.

Tordesilhas e a Passarola de Gusmão

Há dois documentos relacionados com Portugal expostos na Lux in Arcana: a bula Inter Cetera (1493), do Papa Alexandre VI, o valenciano Rodrigo de Borja, que estabelece a partilha do mundo entre Portugal e Espanha, inicialmente consagrada no tratado de Alcáçovas (1479) e em 1494 corrigida pelo tratado de Tordesilhas; e o desenho da Passarola do padre Bartolomeu de Gusmão. 

Na bula, Alexandre VI estabelecia que os territórios a oeste de um meridiano imaginário, a 100 léguas dos arquipélagos dos Açores e de Cabo Verde, passariam a estar submetidos aos reis de Castela. Um ano depois, em Tordesilhas, o novo acordo passaria a zona de influência portuguesa até às 370 milhas para oeste dos Açores - o que incluía já uma parte importante do que é hoje o Brasil. Este facto faz com que vários historiadores pensem que D. João II teria já informações sobre a existência do território do Brasil. 

O segundo documento é o desenho da "Passarola de Gusmão" (na foto), incluído num dos manuscritos do Fundo Bolognetti. Nascido em Santos (São Paulo, Brasil, então ainda colónia portuguesa), em 1685, o padre Bartolomeu Lourenço de Gusmão esteve em Portugal por diversas vezes, tendo sido perseguido pela Inquisição. Em 1709, conseguiu do rei D. João V a autorização de construir um aeróstato e, em Outubro desse ano, mostrou mesmo a sua invenção ao rei e à rainha, Mariana d"Áustria, bem como ao núncio apostólico, o cardeal Michelangelo Conti, futuro Papa Inocêncio XIII. 

Esta primeira experiência da "máquina para viajar de barco no ar", recorda o catálogo, pode ter sido apenas um balão de ar quente. O desenho de Gusmão deve ser apenas uma forma de chamar a atenção para as suas experiências.

sexta-feira, 30 de março de 2012

Um pequeno museu de Arte Antiga no meio de um centro comercial

O Museu de Arte Antiga terá duas exposições no Colombo até final do Verão
O Museu de Arte Antiga terá duas exposições no Colombo até final do Verão  (Miguel Manso)

Exposição no Centro Comercial Colombo

30.03.2012 - 19:04 Por Lucinda Canelas


 Dezenas de obras de arte medievais estão reunidas num módulo de madeira na arena central do Centro Comercial Colombo, em Lisboa. É a primeira vez que o Museu de Arte Antiga faz algo do género. Para seduzir.

Um pequeno museu dentro de um gigante comercial. Uma caixa de madeira de paredes vermelhas com um anjo músico por guardião e 31 obras de arte medievais no interior, como se de uma montra inusitada se tratasse, entre centenas de lojas e um hipermercado. Construir Portugal. Arte da Idade Média, a exposição que foi ontem inaugurada no Centro Comercial Colombo, em Lisboa, leva o Museu Nacional de Arte Antiga (MNAA) a um público que nem sempre se desloca à Rua das Janelas Verdes para ver a mais importante das colecções públicas portuguesas.

Profetas do século XV do Mosteiro da Batalha, pedaços de tecido com caracteres árabes, uma Adoração dos Magos em alabastro, pintura flamenga de evocação religiosa, uma cruz processional feita em Granada com mais de 600 anos e um arcanjo de pedra pintada contam a história da formação do reino, num período de encontro - e confronto - de culturas na Península Ibérica, de grande transformação política, religiosa, social.

A exposição, a primeira de duas que o MNAA fará no centro comercial, integra o projecto A Arte Chegou ao Colombo, lançado no ano passado com Quatro Elementos, Quatro Artistas (Museu Colecção Berardo). Para o director do Colombo, Paulo Gomes, é uma forma de apresentar arte em espaços não tradicionais, para o director de Arte Antiga, António Filipe Pimentel, uma maneira de "abrir uma janela" sobre o museu e de atrair visitantes.

"Estamos numa praça urbana por onde passam milhares de pessoas. Socialmente este é um espaço importante. Estar aqui aumenta a visibilidade do museu e a sua capacidade de sedução", disse Pimentel, lembrando que "é a primeira vez que o museu faz algo assim" e que, aos fins-de-semana, passam pelo Colombo mais de 70 mil pessoas (o MNAA teve no ano passado 129 mil visitantes).

Com esta exposição e com a que se segue, dedicada à Expansão - Desenhando o Mundo. Arte da Época dos Descobrimentos, de 5 de Julho a 30 de Setembro -, o director quer aumentar o reconhecimento nacional da colecção do museu. Por isso, explica, Pimentel e a sua equipa escolheram dois temas que falam ao imaginário de um público alargado. "A Idade Média, com as suas histórias de cavaleiros e reconquistas, e os Descobrimentos são eixos fortemente identitários.

Foi difícil seleccionar

Seleccionar as peças que hoje se podem ver no módulo desenhado por Manuela Fernandes, em vitrinas climatizadas que mantêm, garante José Alberto Seabra de Carvalho, director adjunto do museu, "todas as condições de dignidade e segurança de qualquer obra no MNAA", não foi tarefa fácil. As peças saíram todas das reservas do museu que tem um acervo com mais de 40 mil objectos, muitos deles tesouros nacionais. "A exposição permanente do MNAA não foi alterada", explica Pimentel, "mas o que temos aqui é um pequeno pólo - não quisemos trazer peças, quisemos trazer o museu."

Construir Portugal foi montada de madrugada para não perturbar as rotinas do centro, nem pôr em risco a segurança das peças. O programa expositivo começa com a cristianização do território e vai até ao final da Idade Média, com duas esculturas retiradas no séc. XIX do portal do Mosteiro de Santa Maria da Vitória (Batalha) a fazerem a ponte para a exposição dos Descobrimentos. "São duas peças de grande qualidade artística e que pertencem ao monumento simbólico da dinastia de Avis, intimamente ligada à Expansão. São elas que abrem a porta para o mundo que vamos mostrar a partir de Julho."

Nesta exposição merecem ainda destaque uma pintura da Virgem com o Menino - "exemplo de como este período medieval é também o da criação de uma arte transportável, sinónimo de disseminação cultural, de afirmação de uma certa elite e de um certo tipo de devoção, mais intimista" - e um quadro de S. Tomás de Aquino (oficina portuguesa, c.1530), em que aparecem representados os livros que, para evitar "riscos injustificáveis", não estão na exposição.

Para já, o Colombo não quer revelar os custos de montagem das duas exposições do MNAA. O seu director prefere chamar-lhe investimento e limita-se a dizer que envolveu nesta operação 15% do seu orçamento de marketing. O MNAA não recebe qualquer contrapartida financeira.

segunda-feira, 26 de março de 2012

Os sinais de Salazar em Santa Comba



Correio da ManhãHistórias

Já não há estátua e as propriedades do ditador estão ao abandono. Apenas um largo e uma avenida com o seu nome
25 Março 2012

Por:Manuel Catarino

 
O espólio de Salazar doado pelo sobrinho continua encaixotado

A bomba pôs fim à discussão. A Câmara Municipal de Santa Comba Dão queria recolher o que restava da estátua – mas uma parte da população, apoiada por saudosistas de fora da terra, pretendia restaurá-la. A estátua já não tinha cabeça – e ali estava Salazar, sentado no alto de um pedestal de granito, ridiculamente decapitado. Na madrugada de 12 de Fevereiro de 1978, um domingo, a vila acordou com o estrondo. Uma carga de dinamite reduziu Salazar a pedaços. Conversa acabada. O povo ficou sem estátua para restaurar – e a autarquia pôde finalmente livrar-se da polémica. O que sobrou da estátua, uma amálgama de cobre retorcido, repousa hoje na cave da Casa da Cultura.
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A memória do homem nascido na freguesia do Vimieiro e que governou o País com mão-de-ferro durante décadas divide o povo do concelho: uns querem perpetuá-lo saudosamente, outros nem por isso. Apenas parecem unidos no velho sonho que o município alimenta há anos para a construção de um centro museológico dedicado ao Estado Novo – o período da História de Portugal fundado em 1933 por Oliveira Salazar. Em Santa Comba Dão, os únicos sinais visíveis do ditador são o largo que ainda mantém o seu nome – e, no Vimieiro, a avenida Dr. Oliveira Salazar, a antiga estrada para Coimbra que passava à porta da casa onde nasceu e da outra que comprou já era presidente do Conselho.
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Até a iniciativa do presidente da Câmara, João Lourenço, de engarrafar um vinho da região com a marca ‘Memórias de Salazar’, é recebida com alguma cautela. Rui Félix, de 76, reformado da indústria dos mármores, desconfia da qualidade da pinga. "No concelho de Santa Comba, por causa da humidade excessiva, não há vinho capaz" – diz. E Salazar, muito provavelmente, merecia melhor. Rui Félix nem quer imaginar que se dê a uma zurrapa qualquer o nome do homem que "fez tanto" por este País.
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Mas o presidente da autarquia, João Lourenço – que mantém absoluto segredo sobre o produtor, "para evitar problemas" – garante que o vinho "não vai envergonhar ninguém". Sérgio Viegas, proprietário de um café no centro da cidade, não está nada preocupado com a qualidade do tinto. É o que menos lhe interessa: "Pior ou melhor, o vinho há-de beber-se. Isto dos produtos com a marca de Salazar é bom para o comércio. Muita gente se calhar passa a vir cá para comprar recordações."
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O HERDEIRO
O espírito saudosista dos da terra e dos de fora é tenazmente combatido por quem menos se espera – o sobrinho-neto do ditador, Rui Salazar de Lucena e Melo. Vive na moradia herdada dos pais, no enfiamento das casas com a quinta nas traseiras que foram propriedade do tio.
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Rui Salazar nem quer ouvir falar do vinho com o nome do chefe incontestado do Estado Novo. "O professor Salazar foi um estadista que marcou como nenhum outro um período bastante significativo da História de Portugal. Transformar o seu nome numa marca comercial, seja de vinho ou de outra coisa qualquer, cheira a saudosismo e isso é a pior maneira de perpetuar a sua memória", diz.
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O que Rui Salazar quer é um museu do Estado Novo – a menina dos seus olhos. Doou à Câmara boa parte do espólio do tio que lhe coube em herança, entre documentos e objectos pessoais, e ainda o seu quinhão (um terço) das casas e da quinta do tio no Vimieiro. Chegou a acordo com o município. Em troca da doação, Rui Salazar receberá mensalmente dois mil euros, a partir do momento em que o museu começar a funcionar. "Para mim só quero 500 euros. Com os outros 1500 constituo um fundo para financiar estudantes interessados em estudar o Estado Novo" – diz.
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O museu tarda. Encalhou na crise – mas, principalmente, nas dificuldades que a Câmara de Santa Comba Dão tem experimentado nas negociações com o irmão de Rui, herdeiro do resto da propriedade. António é proprietário dos outros dois terços. O acordo já esteve firmado – mas foi desfeito à última hora pelo herdeiro. Nada mais restará à autarquia que não seja a expropriação
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O MITO DA POBREZA
Salazar reclamava-se filho de pobres – mas os meios da família não eram assim tão acanhados em rendimentos como o mito fez crer.
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O pai, António Oliveira, que já dobrara os 50, e a mãe, Maria do Resgate, já com 44 anos, não esperavam ver aumentada a prole. Tiveram quatro filhas de enfiada – Marta, Elisa, Leopoldina e Laura, assim por esta ordem – em nove anos de casamento. Veio-lhes, por fim, um filho varão. A criança nasce pelas três da tarde de 28 de Abril de 1889, num chuvoso domingo de Primavera, na casa de família, no Vimieiro, a dois passos de Santa Comba Dão. O menino fica António, mais os apelidos Oliveira, como o pai, e Salazar, como o avô materno.
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Naqueles confins das Beiras mandam os Perestrelos, senhores de terras. A rica família fidalga contratara António Oliveira como feitor – cargo de rendimento certo e de alguma projecção social. O pai de Salazar passa então a ser respeitosamente tratado por António Feitor. Os mais influentes da sede do concelho davam-lhe a honra do aperto de mão.
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A intimidade tinha os seus limites. António Oliveira convidou para padrinhos do filho mais novo dois Perestrelos, António Xavier Perestrelo Corte-Real e Maria de Pinna Perestrelo, pai e filha – que aceitam o encargo, mas não põem os pés na igreja. O menino é baptizado a 16 de Maio, uma quinta-feira, pelo padre António Nunes de Sousa. Os ilustres padrinhos fazem-se representar por gente mais ao nível do feitor – o carpinteiro Francisco Alves da Silva e a mulher, Luísa da Piedade.
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A casa onde Salazar nasceu fica mesmo à beira da estrada, caminho dos almocreves com as bestas de carga. António Oliveira e Maria do Resgate, aí pelo nascimento da segunda filha, transformam parte da casa em hospedaria e taberna: ele continuou com feitor – enquanto a mulher toma conta do negócio com desenvoltura e austeridade. António Oliveira ainda conseguirá ganhar bom dinheiro como intermediário na venda de lotes de terreno, no Bairro Novo da Estação.
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TAL MÃE, TAL FILHO
O rosto de Maria do Resgate repete-se no filho. As quatro filhas puxam mais ao pai. Salazar tem as feições da mãe: os mesmos olhos miúdos e penetrantes, a mesma face cavada, os mesmos lábios finos. O rapaz cresce fracalhote e tímido. Brinca com as irmãs. A mãe é tudo para o menino – e o filho é tudo para ela.
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Aos sete anos começa a aprender, a ler e a contar – com lições particulares, em casa, todos os fins de tarde, pelo escriturário municipal José Duarte. Ao fim de três anos, Salazar, num dia de Verão de 1899, é aprovado em Viseu no exame da instrução primária. O negócio da hospedaria prosperava. Havia saúde e dinheiro. A família construiu outra casa, perto da antiga, mais espaçosa. António Oliveira, com invulgar olho para o comércio, publicava anúncios em jornais da região a chamar hóspedes e comensais. Sonhava ver o filho tomar-lhe o lugar de feitor dos Perestrelos e queria treiná-lo para os trabalhos do campo.
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Mas Maria do Resgate tinha outros planos para o rapaz, pretendia dar-lhe estudos, e correu a tomar os avisados conselhos do prior. O padre António também era de opinião que o menino, inteligente, podia ir longe nos saberes. Só via um inconveniente: achava-o demasiado delico-doce para aguentar as malvadezas dos rapazes do liceu de Viseu. A não ser, sugeriu o cura, que estudasse no seminário, lugar de ordem e disciplina. Maria do Resgate não quis ouvir mais. Estava decidido.
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No final do Verão de 1900, Salazar sai para sempre do aconchego do lar, no Vimieiro. Já completara os 11 anos. A mãe estraga-o com uma malinha de roupa no seminário de Viseu, no antigo convento dos Néris, casarão de dois andares, assombroso, gelado. A criança habituada aos desvelos maternos fica agora aos cuidados do austero padre José Frutuoso da Costa, que garantia a disciplina com mão-de-ferro.
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FÉRIAS NO VIMIEIRO
Salazar nunca deixou de ir ao Vimieiro. Nos tempos de estudante em Coimbra, depois como lente da Faculdade de Direito e já todo-poderoso presidente do Conselho, a partir de 1932, passava as férias no sítio onde nasceu.
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Ao que era dos pais foi acrescentando propriedade sua – à medida das posses. De uma vez com um empréstimo amigo. O padre Carneiro de Moura, abastado sacerdote de Coimbra que financiava a propaganda católica contra os desmandos da República, adiantou--lhe a fortuna de 150 contos de réis. Salazar, já chefe do Governo, comprou mais um bocado de terra aos Perestrelos para acrescentar à sua quinta – onde fazia vinho.
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Elsa Amaral, de 73 anos, reformada como enfermeira-chefe da Maternidade Bissaya Barreto, vive na casa onde nasceu – praticamente paredes meias com a quinta de Salazar. Lembra-se muito bem do presidente do Conselho. "Era um homem encantador. Gostava de crianças. Cumprimentava-me sempre com um beijinho" – recorda.
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Fernando Durães, hoje com 80 anos, só viu Salazar ao longe: "Subia a rua a caminho da escola e, quando ele lá estava, fugia para o outro lado com medo dos guardas fardados e dos homens à paisana que se dizia que eram agentes da polícia política."
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"VENDAVAL DE ALEGRIA"
Mas a vizinha Elsa nunca teve medo do "encantador" Salazar. Até acompanhou o namorico do chefe do Governo com Christine Garnier: "Passeavam os dois muito queridos e conversavam sentados à porta". Christine, literata e jornalista nascida na Bélgica e com vida em Paris, imaginou um livro que lhe traria fama e proveito: uma biografia íntima de Salazar. O chefe do Governo, no primeiro contacto em Lisboa, fica seduzido – tanto que a convida a visitá-lo na terra.
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Christine Garnier passa um curto período de férias no Vimieiro. Vivem um doce namoro. Ela fica hospedado no Hotel da Urgeiriça. Trabalha apaixonadamente no livro com Salazar – enquanto o marido se perde nas noites de Lisboa e de Cascais pela mão do banqueiro Ricardo Espírito Santo. Salazar, em carta ao embaixador Marcello Mathias, recordará estes tempos como um "vendaval de alegria" e "uma desordem perfumada".
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A enfermeira Elsa ainda hoje se lembra da toilette de Christine Garnier: "Ela alternava uma saia castanha com cornucópias em dourado com um vestido preto muito elegante". Um detalhe: "Ela andava sempre de saltos altos e, claro, Salazar dava-lhe o braço. Faziam um par muito bonito." Faz-lhe dó o estado de abandono em que se encontra a propriedade de Salazar: "Podemos não gostar do que ele fez ou deixou de fazer, mas foi um homem que marcou o País e ninguém pode apagá-lo da História."
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Tina Coimbra, comerciante, nunca viu Salazar por perto. Mas admira-lhe a obra: "Fez muito por este País. Merece-nos todo o respeito e admiração". E, a propósito do vinho com o seu nome, Tina só espera que a qualidade esteja à altura do homem que lhe dá o nome.
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DECAPITADA, DESTRUÍDA À BOMBA E ESCONDIDA
A estátua de Salazar em Santa Comba – inaugurada em 27 de Abril de 1965, com toda a pompa e circunstância na presença do Presidente da República, almirante Américo Tomás – foi decapitada nos tempos quentes que se seguiram à Revolução de 25 de Abril. Um grupo de admiradores financiou uma cabeça nova. Mas o pior aconteceu.
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A cabeça, mal tiradas as medidas, não encaixou no pescoço da estátua – e Salazar lá continuou decapitado no pedestal. A cabeça está agora guardada numa arrecadação da Câmara. É um embaraço. Ninguém sabe o que fazer com ela. Uma bomba acabou com o que restava da estátua. Hoje, no seu lugar, está um monumento de homenagem aos combatentes do concelho. 

quarta-feira, 14 de março de 2012

Golfinhos voltaram ao Tejo, agora desenhados nos pilares da ponte 25 de Abril


 


Marisa Soares
A Estradas de Portugal está a decorar as sapatas dos pilares da ponte 25 de Abril, que liga Lisboa a Almada, com imagens de golfinhos, orcas, cachalotes e aves marinhas.

Esta iniciativa, intitulada "Ponte Viva", tem como parceiro o Projecto Delfim, uma associação científica que estuda animais marinhos e se dedica, por exemplo, a acompanhar a população de golfinhos residentes no estuário do Sado.

O objectivo é "mostrar que é possível fazer o casamento entre as infra-estruturas rodoviárias, que normalmente têm um grande impacto no ambiente, e os projectos de sensibilização ambiental", disse a responsável pelo gabinete de Ambiente da EP, Ana Cristina Martins, que acompanhou os jornalistas nesta quarta-feira numa visita aos pilares da ponte.

As pinturas estão integradas nos trabalhos técnicos de conservação das sapatas da ponte, uma intervenção que se tornou necessária depois de a inspecção subaquática aos pilares, que decorreu entre Fevereiro e Abril do ano passado, ter detectado "alguma corrosão" naquelas estruturas.

"As obras de conservação das sapatas já foram feitas, esta é a última fase desse trabalho", afirmou a responsável da EP pela ponte 25 de Abril, Fernanda Santos, acrescentando que o orçamento necessário para este projecto se inclui no valor total destinado aos trabalhos de inspecção, 76.300 euros. A pintura das sapatas estava já prevista, só mudam as cores das tintas, que variam entre o cinzento claro e escuro, o preto e o branco. 

As pinturas, que estão a ser feitas por 15 trabalhadores, decorrem em função das marés. Quando há maré cheia, a água sobe dois metros e obriga a interromper os trabalhos. Quando a maré está baixa, tem de ser limpa a superfície de cimento, é aplicada uma primeira demão de tinta, e meia hora depois os pintores avançam para a segunda demão. 

Para já ainda só está concluída a pintura do pilar três, que fica junto à margem Sul do Tejo. No pilar quatro, que fica a meio da ponte, os trabalhadores ainda não concluíram as imagens dos golfinhos e das orcas. Em terra, nos pilares junto às Docas de Alcântara, em Lisboa, vão ficar também golfinhos, que acompanham os flamingos, os maçaricos e os alfaiates.

As pinturas deverão estar concluídas no final de Março. Até ao final do ano, a EP conta terminar todos os trabalhos que dizem respeito à inspecção da ponte, que voltará a acontecer daqui por cinco anos.

Notícia corrigida às 19h32: clarifica o título 

terça-feira, 13 de março de 2012

Camogli, Mareggiata 30 Ott 2008, di Elisabetta Pinotti.





Enviado por  em 07/11/2008
Some pictures of Camogli (Italy) in sequence: storm of October 30, 2008 (7:50 h) - Camogli mareggiata del 30 ottobre 2008 (h 7:50), sequenza fotografica

teahupoo - the dangerous wave



Enviado por  em 19/09/2009
One of the most dangerous big waves in the world.
A water monster: fast, powerful and mortal..
Welcome to Thaiti; welcome to Teahupoo!
Music by Didjitalis. Like their facebook page in the link below:




Fado Perseguição ~ Avelino de Sousa e Carlos Maia




SEGUNDA-FEIRA, 7 DE DEZEMBRO DE 2009

Perseguição

Em 1945 Amália grava o seu primeiro disco onde estava incluído este fado

Letra de Avelino de Sousa música de Carlos da Maia - fado perseguição
Se de mim nada consegues
Não sei porque me persegues
Constantemente na rua;
Saber bem que sou casada
Que fui sempre dedicada
E que não posso ser tua

Lá porque és rico e elegante
Queres que eu seja tua amante
Por capricho, ou presunção
Eu tenho um marido pobre
Que possui a alma nobre 
E é toda a minha paixão

Rasguei as cartas sem ler
E nunca quis receber
Jóias ou flores que trouxesses
Não me vendo nem me dou
Pois já dei tudo o que sou
Com o amor que não conheces

Nesta gravação não sabendo porque razão Amália não canta esta última quadra, que contudo faz parte do fado, conforme cantava a Maria Alice (a criadora deste fado),mas que trocava esta sextilha pela anterior.

Como sentinela alerta
Noite e dia sempre esperta
Na posição de sentido
Eu sou, a todo o instante
Sentinela vigilante
Da honra do meu marido

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segunda-feira, 12 de março de 2012

João Black ~ brasil

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Enviado por  em 22/07/2011
"Uma mistura de Michael Jackson, James Brown e Tony Tornado". Esta é uma bela descrição de João Black, estrela da comunidade do Arará, em Benfica, que se divide entre ser artista e costureiro, pois um não sobrevive sem o outro. João Luís Pereira de Abreu nasceu no Jacarezinho, um ano depois que Michael Jackson.Aos cinco anos, sua família perdeu a casa em uma enchente e eles foram levados ao Arará. Em um ano que ele não se lembra mais -- "Faz muito tempo, mas muito mesmo"


João ‎Black ~ Fado anarquista


Canzoni contro la guerra

João Black - Fado Anarquista


João Black (Feijó, 28 de Setembro de 1872; Lisboa, 18 de Dezembro de 1955) foi um dos fadistas mais comprometidos ideologicamente com valores do anarquismo, socialismo e republicanismo. João Salustiano Monteiro tornou-se João Black por homenagem ao seu protector, o inglês Alexander Black, patrão do pai radicado em Almada que lhe pa-gou os estudos. Black foi o que se poderia chamar de fadista de intervenção: as suas letras versavam sempre propósitos ideológicos da República. Andar nos jornais deu-lhe essa consciência.

Comentários da pessoa que enviou o vídeo (ecoscanner)

  • Aconselho também uma visita ao site da Torre do Tombo, onde se encontra uma outra composição de nome "A Batalha - Hino Revolucionário", com autoria atribuída ao maestro Tomás del Negro e João Black, musica e letra, respectivamente. O material foi considerado "propaganda anarquista" por a tenebrosa PIDE, que ao ser desmantelada em 1974 pelos vitoriosos revolucionários da altura, viu assim o seu "espolio" sob o zelo da Torre do Tombo.
    Nem deus, nem amo!!
  • @theH0UNDSofD00M obrigadao pela info!
  • Primeiro que nada obrigado pelo upload, segundo queria propor que adicionasses o link do site A Viagem Dos Argonautas, já que me parece ter sido de onde veio o excerto que usaste na descrição do vídeo. Nao o faço como uma critica mas apenas para facilitar a vida daqueles que, como eu, querem conhecer melhor João Black.
[Prima del 1926]‎
Testo trovato su YouTube


28 maggio 1926. Il generale Gomes da Costa entra a Lisbona alla testa delle sue truppe ‎dopo il golpe contro la Prima Repubblica. Dovrà passare quasi mezzo secolo prima che il ‎Portogallo torni alla democrazia… ‎
28 maggio 1926. Il generale Gomes da Costa entra a Lisbona alla testa delle sue truppe ‎dopo il golpe contro la Prima Repubblica. Dovrà passare quasi mezzo secolo prima che il ‎Portogallo torni alla democrazia… ‎


Nel XX secolo il fado come espressione ludica di contestazione contro il potere e contro i suoi ‎simboli, assume una rilevanza tutta speciale: il fado di aspetto sociale – a volte conosciuto come ‎fado operaio o libertario – diventa canzone di protesta, soprattutto nei primi anni venti del secolo, ‎anni in cui in un contesto repubblicano è possibile ed è incrementata una cultura popolare, in cui il ‎fado diventa veicolo di propaganda di nuove idee. Il fado quindi tratta in modo lirico temi sociali ‎come la fame, la miseria, la lotta contro i padroni, la fede in una vita migliore ed in un futuro dove ‎la vittoria finale è un dato di fatto.‎
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Un esempio emblematico di questo periodo è il poeta popolare, di professione tipografo, uomo di ‎fine gusto letterario ed eccellente fadista che risponde allo pseudonimo di João Black, assiduo ‎frequentatore delle taverne di Cacilhas e di Ginjal. Il suo vero nome era João Salustiano Monteiro ‎ed era di Almada, località dove nacque e trovò la morte nel 1955. Poeta, compositore e cantante, ‎questo socialista di formazione repubblicana – militò nel Partito Socialista di José Fontana nel ‎‎1914 - , noto frequentatore di feste e convivi notturni, amante della vita scapigliata, è stato un vero ‎protagonista del periodo in cui il fado ha guadagnato un ruolo sociale, diventando famoso tra la ‎classe sociale popolare, grazie anche all’intensa attività fatta dagli innumerevoli collettivi di cultura ‎e svago allora esistenti, punto di incontro di cantanti, chitarristi e poeti popolari.‎
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João Black assistette all’apogeo e alla progressiva scomparsa di questo fado di protesta – figlio e ‎padre di una cultura popolare, operaia – subito censurato dal Segretariato Nazionale di ‎Informazione di António Ferro e dalla sua Emittente Nazionale. Fu proprio a causa di queste ‎alterazioni sociali che il fado perse il carattere amatoriale ed il suo ruolo di veicolo di idee e principi ‎morali e politici, diventando un mero intrattenimento ed un articolo da sfruttarsi a livello ‎commerciale. Come disse lo stesso João Black “Il Fado di stampo sociale non è morto, è passato di ‎moda, sopravvivendo qua e là nella memoria di alcuni interpreti […] tra cui il famoso ‎‎Alfredo Marceneiro che canta come João ‎Black.”‎

‎(Fonte: Portogallo: ‎storia dei canti politicamente e socialmente impegnati fino agli anni 50, dal blog Fado Portoghese ‎di Luisa Notarangelo)
Ciência humanitária 

Um símbolo de altruísmo 
Tem como fim condenar 
Deus, pátria e militarismo 
‎ 
O mundo há-de assitir 
Aos pobres livres do jugo 
Espezinhar é o futuro 
Da burguesia a surgir 
‎ 
E depois quando existir, 
O ideal ... 
Esplendor e bem-estar 
Incitar o patriotismo 
A miséria, 
o anarquismo tem por base condenar 
‎ 
Mas o povo subjugado 
Esfacela-se sob a tortura 
Quando o seu mal tinha cura 
O ideal desejado 
‎ 
Viver na prisão 
Nas garras dos inimigos 
Ai ela bem cai no abismo 
A fanática humanidade 
Pois fia-se nesta trindade 
Deus, pátria e militarismo


inviata da Bartleby - 20/2/2012 - 14:17




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