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sábado, 23 de janeiro de 2010

Haiti: um caos inventado pela mídia

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por Admin última modificação 2010-01-22 12:53 Alejandro Ramírez 
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Os meios escolhem as cenas mais fortes, mais mórbidas e mais sensacionalistas e as repetem uma e outra vez, criando uma imagem totalmente distorcida da realidade

22/01/2010

Alejandro Ramírez
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“Os meios de informação desinformam”. Li isso uma vez em um livro de Eduardo Galeano e nunca o tinha notado tão claramente como agora. Agora que tenho acesso às cadeias de televisão estrangeiras, aos monstros da informação, é que me dou conta da manipulação como nunca antes. O mundo está vendo as cenas de pessoas brigando por causa do mau manejo das agências de ajuda humanitária e pela desorganização das autoridades que supostamente deveriam entregar esta ajuda. O que é isso de jogar água a partir de um helicóptero? Isso não é ter dignidade. As ajudas não estão chegando porque as agências têm medo das estradas. Estão causando muito mais dano do que já existe. Não estive em Porto Príncipe, mas posso dar fé que em Jacmel não existe a situação que apresentam.
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Os meios escolhem as cenas mais fortes, mais mórbidas e mais sensacionalistas e as repetem uma e outra vez, criando uma imagem totalmente distorcida da realidade. O Haiti tem um povo que sofre este terremoto como a pior desgraça dos últimos anos, além de todos os problemas que já leva em suas costas, mas, apesar disso, há neste povo um sentimento de seguir adiante, de se organizar para resolver os problemas. Fui testemunha de famílias que foram ajudadas, nos momentos mais difíceis, pelos vizinhos, por falta de ajuda governamental ou oficial. Foram as próprias pessoas que ajudaram, metendo-se nos escombros para tirar os que ainda estavam vivos, os que não conseguiam levantar as placas de cimento e que não tinham como fazer nada. Foram famílias de muitos povoados distantes de Porto Príncipe as que alojaram os que ficaram sem teto na cidade.
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Solidariedade
No campo de futebol de Jacmel, onde hoje se refugiam 3.200 pessoas que ficaram sem casa, há todo um sistema de cozinhas coletivas, e as mães e mulheres se revezam para cozinhar para todos. Os homens cortam a lenha com machados e carregam os sacos de comida. As crianças fazem fila organizadamente para encher seus baldes de água, e os que já os levaram para suas famílias que se refugiam em tetos de nylon brincam sorrindo. Ao escritório da Crose (Coordenadora Regional de Organizações do Sudeste) chegam muitas pessoas todos os dias para ver como podem ajudar voluntariamente. São os que percorreram todos os bairros de Jacmel a pé, inclusive na montanha, para diminuir as estatísticas de casas afetadas e de famílias com problemas.
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Fala-se da crescente insegurança, que não é possível transitar por nenhum lado por causa dos saques. Não nego que possa haver atos delitivos, mas é lógico que tirem as coisas dos comércios que desmoronaram e as levem embora. Este povo tem fome de séculos, não é razoável que nestes momentos a comida fique enterrada.
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No entanto, caminhei por todas as ruas de Jacmel com minhas duas câmeras no pescoço sem sentir uma pitada sequer de agressividade ou algum olhar estranho, coisa que não posso fazer na Cidade da Guatemala ou em Caracas. Todo mundo me recebeu com afeto e inclusive me levaram aos lugares onde estão seus problemas, e lamento muito meu conhecimento nulo do crioulo ou do francês, pois me contavam histórias que eu não conseguia entender. Entretanto, muitos falam espanhol e eles conseguiram dizer seus sentimentos, a mim, um branco desconhecido que invade seus espaços.
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Vida normal
Percorremos a distância entre Jacmel e Anse-a-Pitre em um carro da Crose, uma Nissan 4x4 cheia de malas e volumes, e nos 187 quilômetros que separam essas duas comunidades não encontramos nenhum problema de pilhagem como costumam dizer. O que vi, sim, foram muitas pessoas montadas em seus burros indo ao campo trabalhar, os carvoeiros fazendo seus fornos, as mulheres carregando água como sempre, os mercados comunitários vendendo seus produtos. Sim, a preços mais altos, claro. O preço da gasolina subiu muito e isso encarece tudo, mas as pessoas do campo levam sua vida normalmente, buscam garantir a vida com seu trabalho, que muitas vezes não lhes proporciona o suficiente para comer.
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Então, como os meios de comunicação podem dizer que tudo é desastre se existe um montão de corações que ainda batem com um sentimento humano de solidariedade que sempre se nota mais entre os que menos têm? E este povo é possivelmente um dos povos que menos tem, e menos ainda agora.
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Alejandro Ramírez, cineasta guatemalteco, presenciou o terremoto no Haiti ocorrido no dia 12

Tradução: Igor Ojeda
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