Discurso de Lula da Silva (excerto)

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sexta-feira, 27 de novembro de 2009

Costa Gomes - o Marechal Bicéfalo, por António Barreto

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Costa Gomes e Vasco Gonçalves

Marechal Costa Gomes
Criado terça-feira, 31 de Julho de 2001
Última actualização sábado, 5 de Maio de 2001


O Marechal Bicéfalo
Por António Barreto
01.08.2001 - Público

São muitos os portugueses que lhe atribuem um feito raro: salvou a democracia portuguesa num dos seus momentos mais difíceis. Na madrugada de 11 para 12 de Março de 1975, quando uma assembleia do Movimento das Forças Armadas (MFA) toma decisões cruciais para a prossecução da revolução (demissão de numerosos oficiais ditos "golpistas", substituição de comandos militares, extinção dos conselhos de armas dominados por oficiais moderados, criação de um tribunal revolucionário que nunca chegará a funcionar, institucionalização do MFA, criação do Conselho da Revolução, preparação da nacionalização da banca, dos seguros e de outros sectores e empresas, etc.), o então Presidente da República e da Junta de Salvação Nacional, General Costa Gomes, consegue, no meio do enorme cansaço dos presentes, fazer aprovar uma resolução garantindo a realização das eleições para a Assembleia Constituinte. Estas, previamente marcadas para Março, são adiadas para Abril. A 25, nem mais.
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Por outras palavras, no preciso momento em que, apoiados pela maior parte dos partidos de esquerda que, na rua, mostravam os seus entusiasmos, os militares revolucionários davam o maior passo na conquista do poder, Costa Gomes aprovava a decisão que iria pôr em causa a revolução e que, a prazo, lhe poria termo. Nunca saberemos exactamente o que lhe ia na cabeça: com as eleições, pretendia ele garantir a democracia para mais tarde? Ou forjar desde logo o instrumento que iria liquidar a revolução? Ou, finalmente, tentar juntar democracia e revolução? De qualquer modo, o resultado conta. E são muitos os testemunhos que confirmam o facto e sublinham o papel pessoal do Presidente. Creio que lhe ficámos a dever isso. Não é pouco.

Mas o episódio tem que se lhe diga. Em certo sentido, é a síntese do seu comportamento e, talvez, do seu carácter. Costa Gomes viveu entre dois mundos: o militar e o político; a guerra e a ciência; a esquerda e a direita; o socialismo e a democracia; a revolução e o Estado de direito; as "conquistas" e a legalidade; a discrição e a ribalta. Foi, aliás, Presidente da República, no momento em que Portugal vivia plenamente um período de dualidade de poder. Ele próprio personificava essa dualidade. Em Agosto de 1975, por exemplo, no momento em que dava posse ao mais esquerdista de todos os governos que o país conheceu (o famoso V.º Governo de Vasco Gonçalves, dos militares esquerdistas e do PCP), não se coibia de dizer aos empossados que lhes agradecia o sacrifício, tanto mais que era por pouco tempo, não mais do que uma breve transição. E preparava-se assim para dar posse ao VIº Governo, o de Pinheiro de Azevedo, que irá, com o Grupo dos Nove, os militares moderados, o PS e o PPD, presidir ao 25 de Novembro e ao início da contra-revolução.
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A História deu-lhe uma alcunha, "O Rolha". O entendimento era simples: boiava sempre. Qualquer que fosse o problema, a crise ou a solução, ele encontrar-se-ia sempre à tona. Como que levado pelas circunstâncias e regido pelo oportunismo. Não creio que a alcunha lhe faça justiça. Costa Gomes colocou-se sempre na charneira das forças opostas, mas com uma ideia sua, com uma vontade de levar a cabo o seu plano. O facto de o plano não ser previamente conhecido pelo público não altera o essencial, apenas sublinha o seu carácter misterioso. A circunstância de ele não ser um "combatente de primeira linha", mas começar por ser o segundo ou ficar à espera que o viessem buscar, não chega para fazer dele um homem passivo, só reforça a prudência com que agia. E o caso de, no seu plano, pretender frequentemente objectivos opostos e ter quase sempre desígnios incompatíveis, também não faz dele um passivo influenciável, mas tão só um ser contraditório.
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Fez o seu curso militar, mas ao mesmo tempo completou, dizem que com brilho, a licenciatura em matemática. É considerado por muitos oficiais como o principal estratega militar da segunda metade do século XX português, mas será como político que ficará na história. Autor do plano de desmilitarização de Goa, na perspectiva de salvar os soldados portugueses e de estimular a agressão indiana que daria, pensava Salazar, a razão a Portugal, demonstrou, em Moçambique, qualidades excepcionais de comando militar. Partidário, desde o início dos anos sessenta, de uma solução política para a questão colonial, tem lugar de honra no quadro dos comandantes militares que mais êxitos teve na guerra colonial. Foi um dos principais responsáveis pelo domínio militar que os portugueses conseguiram obter, em Angola, sobre os movimentos de independência, mas virá a ser o principal signatário da independência daquela colónia. Reduziu o MPLA à quase insignificância militar, mas concedeu-lhe mais tarde um estatuto privilegiado. Entendeu-se, ainda durante a guerra, com a UNITA, que empurrava contra os outros movimentos, mas, de vez em quando, dava às tropas de Savimbi autênticas tareias.
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Formou-se nas escolas da NATO e foi especialmente condecorado pela polícia política (PIDE), mas acabou na presidência do Conselho Mundial da Paz, criação da União Soviética. Nomeado para o Governo, em 1958, por Salazar, contra ele conspirou três anos depois. Nomeado, em 1972, Chefe de Estado Maior General das Forças Armadas, por Marcelo Caetano, por ele será exonerado em Março de 1974, após ter recusado prestar vassalagem ao Presidente do Conselho em pleno declínio. Aceitou, em Janeiro de 1974, o General António de Spinola como seu Vice-chefe de Estado Maior General, mas foi seu vice-presidente "de facto" na Junta de Salvação Nacional e na República. Em ambos os cargos lhe sucedeu como presidente. Permitiu-lhe, antes da revolução, a publicação do livro "Portugal e o Futuro", na certeza, quem sabe, de que seria a faísca necessária para pegar fogo ao regime e levar Caetano ao desespero. Não escreveu o livro, mas deixou escrevê-lo.
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Era o General favorito de muitos oficiais do MFA, mas, na noite do 25 de Abril, ficará em segundo lugar, atrás de Spinola, nunca se saberá se resignado, se à espera que a revolução liquide o seu primeiro filho. A 20 de Novembro de 1975, pouco tempo depois de ter demitido o governo revolucionário e dado posse ao governo moderado de "aliança nacional", recebe em Belém milhares de manifestantes revolucionários, a quem declara: "...em Portugal não haverá jamais uma social-democracia"! Poucos dias depois, a fim de evitar qualquer hipótese de guerra civil, tudo faz para neutralizar as unidades militares esquerdistas, o que consegue, com a ajuda dos regimentos moderados. É sob os seus auspícios que, em 1975 e 1976, o MFA assina dois "Pactos" com os partidos políticos: o primeiro, a 11 de Abril de 1975, consagra funções excepcionais para o MFA e um lugar preponderante dos militares no futuro regime político, assim como define limites drásticos à liberdade dos futuros constituintes; o segundo, em Fevereiro de 1976, mau grado manter um Conselho da Revolução, é um recuo notabilíssimo relativamente ao anterior e garante uma significativa autonomia do poder político civil.
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Figura no elenco dos Chefes de Estado portugueses, mas não na folha dos Presidentes eleitos. Serviu, como poucos, o Estado, mas acabou sempre por contrariar os poderes estabelecidos. Quis garantir, em simultâneo, a legalidade constitucional e a legitimidade revolucionária. Tentou viver, ao mesmo tempo, a ordem e a revolta.

Paz às suas almas.
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