Discurso de Lula da Silva (excerto)

___diegophc

quinta-feira, 30 de julho de 2009

A Corrida Espacial EUA-URSS


A Lua e a Terra

Completaram-se quarenta anos sobre a data em que Neil Armstrong pisou o solo lunar, e sobretudo a RTP assinalou o aniversário transmitindo programas a condizer e pontuais entrevistas acerca do assunto. Convém registar que esses momentos comemorativos ocorreram sobretudo na «2», presumivelmente porque o primeiro desembarque de um homem na Lua terá um vago aroma de coisa cultural e, como se sabe, a RTP parece entender que os telespectadores da «1» não devem ser incomodados com assuntos que de perto ou de longe lhes sobrecarreguem as meninges, bastando-lhes o enlevo com que olham o «Dá-me Música», os concursos e programinhas equiparáveis. Uma coisa é certa: a chegada à Lua de um ser humano mais ou menos como qualquer de nós foi um acontecimento cuja dimensão épica teve a ver com todos os homens e mulheres que há uns bons milénios vêm habitando o nosso planeta, e não foi por acaso, mas sim por lucidez e bom senso, que as palavras proferidas então por Armstrong falaram da Humanidade e não dos Estados Unidos da América. De facto, como é sabido, há muitos séculos, nem ninguém sabe dizer ao certo quantos, que os homens sonhavam aportar ao disco por vezes redondo, noutras vezes nem por isso, que lhes iluminava as noites e as quimeras líricas tocadas por um pouco de nostalgia. Um homem na Lua era verdadeiramente um sinal de vitória da espécie humana sobre o que durante tanto tempo parecera impossível mas sempre gerara sonhos e projectos. Surgia em 1969 como razão para festa e surge hoje como motivo para celebrar.
.
Naquele tempo
.
Infelizmente, porém, a realidade não é representável por uma longuíssima fila de homens e mulheres de mãos dadas em torno do planeta, e é claro que já não o era em 1969, longe disso. Pelo contrário, era o tempo da chamada Guerra Fria, muitas vezes citada sem que se diga ter sido praticamente declarada em Fulton, no Missouri, em Março de 46, isto é, pouco depois do fim da guerra muito quente, escaldante, que foi a Segunda Guerra Mundial, por um senhor chamado Winston Churchill. Segundo ele, descera sobre a Europa uma «cortina de ferro» que pelos vistos o incomodava muito sem que fosse exactamente esclarecida a razão do incómodo, embora se pudesse inferir que a tal «cortina», como aliás a própria designação sugeria, impediria os do Ocidente de marchar para Leste, quer fisicamente quer no plano político-ideológico. Não parece, contudo, que alguém do lado de cá da «cortina» tivesse vontade de iniciar qualquer marcha nessa direcção: Hitler tentara-o pouco tempo antes e dera-se muito mal. O que se pretenderia, isso sim, era caminho aberto para a propaganda anticomunista e para a promoção publicitária do capitalismo, a livre entrada de pessoal ocidental habilitado com diversas capacidades interessantes e secretas. Era, enfim, acabar com o péssimo exemplo que era a URSS aos olhos de muitos milhões em todo o mundo. Já os partidos comunistas haviam saído da guerra enormemente reforçados na França, na Itália, noutros lugares, o que alarmava. Convém dizer que a tal «cortina», mesmo sendo alegadamente «de ferro» não impediu as sementeiras que resultaram nos casos de Budapeste em 57 e de Praga em 68. Quem queira supor que o Ocidente capitalista não teve nada a ver com esses dois dramáticos momentos tem de esquecer o que muitas séries televisivas norte-americanas nos ensinaram, «a brincar», sobre a actividade dos serviços secretos USA no Leste europeu.
.
«Jogada obrigada»
.
Mas a necessidade de extirpar o mau exemplo soviético encontrou outros e porventura mais eficazes caminhos: os que deveriam levar à ruína financeira e económica da URSS mediante uma corrida aos armamentos que atingiria custos fabulosos de todo desaconselhados para um Estado em grande parte reduzido a escombros pela invasão nazi. Os Estados Unidos, cujo território atravessara intacto a guerra e cuja economia se dera muito bem com o conflito, estavam em óptimas condições para impor à União Soviética, como «jogada obrigatória» a que ela não poderia furtar-se, uma competição armamentista que incluía a mobilização bélica do espaço extraterrestre. Infelizmente, a epopeia humana consubstanciada pela chegada de um homem à Lua está contaminada por uma realidade melancolizante: a corrida para a Lua foi parte integrante da corrida para o domínio do Espaço que foi um capítulo da Guerra Fria. Nem por isso deixou de ser epopeia, nem por isso deixou de ser humana. Mas é mais bonito contemplarmos as verdades inteiras, tal como é mais lindo olharmos a Lua Cheia.
,
,
in Avante 2009.07.23
.
.

Sem comentários: